domingo, 27 de março de 2011

Informativo STF Mensal

Brasília, fevereiro de 2011 - nº 6

Compilação dos Informativos nºs 614 a 617

O Informativo STF Mensal apresenta todos os resumos de julgamentos divulgados pelo Informativo STF concluídos no

mês a que se refere e é organizado por ramos do Direito e por assuntos.

SUMÁRIO

Direito Administrativo

Ato Administrativo

MEC: registro de diploma de mestrado em curso de caráter experimental

Concurso Público

Direito à nomeação: existência de cargos vagos e omissão - 5 e 6

Forças Armadas: limite de idade para concurso de ingresso e art. 142, § 3º, X, da CF - 6 e 7

Desapropriação

Decreto expropriatório e transmissão “mortis causa” - 3

Servidores Públicos

Remoção de servidor e ajuda de custo - 2

Direito Constitucional

Controle de Constitucionalidade

ADPF e vinculação ao salário mínimo - 4 a 7

Norma de trânsito e competência legislativa

ADI e limites de despesas com pagamento de pessoal - 1 e 2

ADI e vício de iniciativa

ICMS e salvados - 4

Remoção de titular de serventia extrajudicial - 1 e 2

Concurso público: títulos classificatórios e princípio da isonomia

Processo seletivo de estagiários e entidades do Poder Público

Juiz de Paz: remuneração e custas para habilitação de casamento

Direito Penal

Livramento Condicional

Livramento condicional e crime superveniente

Penas

Lei 8.072/90 e regime inicial de cumprimento de pena - 1 e 2

HC: liberdade provisória e prejudicialidade

Princípios e Garantias Penais

Art. 229 do CP e princípio da adequação social

Princípio da insignificância e usuário de drogas - 2

Tipicidade Penal

Elemento subjetivo do tipo: seqüestro e roubo de veículos

Direito Processual Civil

Direito de Vista

Ausência de procuração e vista dos autos

Legitimidade

Legitimidade do Ministério Público: ação civil pública e patrimônio público municipal - 4

Reclamação e legitimidade de Ministério Público estadual - 3 a 5

Recursos

Repercussão geral e sobrestamento

Direito Processual Penal

Ação Penal

Ação penal: reautuação e novo recebimento de denúncia no STF

Habeas Corpus

HC e estrangeiro não domiciliado no Brasil - 1 e 2

Nulidades

Excesso de linguagem na pronúncia e oitiva de testemunhas

Prisão

Recolhimento compulsório e direito de apelar em liberdade - 1 e 2

Prisão cautelar e ausência de apreciação de HC no STJ

Prisão cautelar e fundamentos - 1 a 3

Progressão de Regime

Exame criminológico e tratamento de usuário de drogas

Recursos

Agravo em matéria penal e deficiência do traslado - 2

Direito Tributário

Contribuições Sociais

CSLL: EC 10/96 e anterioridade nonagesimal - 1 e 2

Decreto-lei 2.052/83 e contribuintes do PASEP - 2

Taxas

Decisão do CNJ e destinação de taxa judiciária a entidades de classe

Impostos

IPI e “leasing” internacional - 1 e 2

ICMS e alienação de salvados de sinistros - 1 a 3

ISS e cessão de direito sobre uso de marca

DIREITO ADMINISTRATIVO

Ato Administrativo

MEC: registro de diploma de mestrado em curso de caráter experimental

A 1ª Turma negou provimento a recurso extraordinário no qual pretendido que o Poder Judiciário

determinasse à Universidade do Rio de Janeiro - URJ a retirada de adjetivação no sentido de que o

diploma de mestrado do recorrente não teria validade perante o Ministério da Educação - MEC. Tratavase,

na origem, de mandado de segurança impetrado contra ato do Sub-Reitor da URJ, que expedira

diploma ao recorrente, mas com a explicitação de não ter validade nacional compulsória, de acordo com o

art. 48 da Lei 9.394/96 (Lei de Diretrizes e Bases da Educação). Entendeu-se que o aluno de curso de

mestrado instituído em caráter experimental, com conhecimento dessa condição, não teria o direito

líquido e certo de exigir da Universidade o registro no MEC de seu diploma. Reputou-se que a

Universidade limitara-se a cumprir o que determinado em lei, a qual não autorizaria a validade nacional

de diploma sem que o curso tivesse sido reconhecido pelo órgão competente.

RE 566365/RJ, rel. Min. Dias Toffoli, 22.2.2011. (RE-566365)

(Informativo 617, 1ª Turma)

Concurso Público

Direito à nomeação: existência de cargos vagos e omissão - 5

Em conclusão de julgamento, o Plenário, por maioria, concedeu mandado de segurança impetrado

contra ato omissivo do Procurador-Geral da República e da Procuradora-Geral da Justiça Militar,

consistente na negativa de nomeação da impetrante, aprovada em concurso público para o cargo de

Promotor da Justiça Militar, não obstante a existência de 2 cargos vagos — v. Informativos 437 e 440.

Prevaleceu o voto proferido pela Min. Cármen Lúcia que reputou haver direito líquido e certo da

impetrante de ser nomeada, asseverando existir, à época da impetração, cargo vago nos quadros do órgão

e necessidade de seu provimento, o que não ocorrera em razão de ilegalidade e abuso de poder por parte

da segunda autoridade tida por coatora. Inicialmente, aduziu estar em vigor o art. 3º da Lei 8.975/95 —

que prevê a existência de 42 cargos de promotor da Justiça Militar —, já que este não poderia ter sido

vetado, implicitamente, em decorrência do veto ao art. 2º do projeto dessa lei, por não haver veto

implícito ou tácito no direito constitucional brasileiro. Além disso, ainda que vetado o art. 3º, teriam sido

excluídos os 42 e não 2 cargos de promotor previstos na norma, uma vez que o veto não poderia incidir

sobre palavras ou expressões (CF, art. 66, § 2º).

MS 24660/DF, rel. orig. Min. Ellen Gracie, red. p/ o acórdão Min. Cármen Lúcia, 3.2.2011.

(MS-24660)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 614, Plenário)

Direito à nomeação: existência de cargos vagos e omissão - 6

A Min. Cármen Lúcia assinalou que, nos termos do parecer do relator designado pela Mesa em

substituição à Comissão de Finanças e Tributação, o Projeto de Lei 4.381/94, convertido na Lei 8.975/95,

estaria de acordo com a LDO e com o orçamento e que o art. 2º trataria da lotação, enquanto que o art. 3º,

da criação dos cargos na carreira, ou seja, neste estaria estabelecido o número de cargos existentes.

Considerou, ainda, que o pronunciamento da segunda autoridade coatora, perante o Conselho Superior do

Ministério Público Militar — no sentido de que seria realizado novo concurso para provimento da vaga

existente e que preferia não nomear a impetrante porque ela se classificara em último lugar no certame —

teria motivado, expressamente, a preterição da candidata. Ademais, reputou demonstrado, nos autos,

como prova cabal da existência de vaga, que a promoção de promotores para cargos mais elevados da

carreira não fora providenciada exatamente para evitar a nomeação da impetrante. Entendeu que essa

autoridade teria incorrido em ilegalidade, haja vista a ofensa ao princípio da impessoalidade, eis que não

se dera a nomeação por questões pessoais, bem como agido com abuso de poder, porquanto deixara de

cumprir, pelo personalismo e não por necessidade ou conveniência do serviço público, a atribuição que

lhe fora conferida. Por fim, o Colegiado destacou que a eficácia da presente decisão abrangeria não

apenas os efeitos pecuniários, mas todos os decorrentes da nomeação. Vencidos os Ministros Ellen

Gracie, relatora, Joaquim Barbosa e Marco Aurélio que denegavam o writ.

MS 24660/DF, rel. orig. Min. Ellen Gracie, red. p/ o acórdão Min. Cármen Lúcia, 3.2.2011.

(MS-24660)

(Informativo 614, Plenário)

Forças Armadas: limite de idade para concurso de ingresso e art. 142, § 3º, X, da CF - 6

Em conclusão, o Plenário reconheceu a exigência constitucional de edição de lei para o

estabelecimento de limite de idade em concurso para ingresso nas Forças Armadas. Assentou, também,

que os regulamentos e editais que o prevejam vigorarão até 31 de dezembro do corrente ano. Por

conseguinte, desproveu recurso extraordinário interposto pela União contra acórdão do Tribunal Regional

Federal da 4ª Região que entendera que, em relação ao ingresso na carreira militar, a Constituição imporia

que lei dispusesse a respeito do limite de idade (CF, art. 142, § 3º, X: “a lei disporá sobre o ingresso nas

Forças Armadas, os limites de idade, a estabilidade e outras condições de transferência do militar para a

inatividade, os direitos, os deveres, a remuneração, as prerrogativas e outras situações especiais dos

militares, consideradas as peculiaridades de suas atividades, inclusive aquelas cumpridas por força de

compromissos internacionais e de guerra”), não se admitindo, portanto, que um ato administrativo

estabelecesse a restrição, sob pena de afronta ao princípio constitucional da ampla acessibilidade aos

cargos públicos — v. Informativos 580 e 608.

RE 600885/RS, rel. Min. Cármen Lúcia, 9.2.2011. (RE-600885)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 615, Plenário)

Forças Armadas: limite de idade para concurso de ingresso e art. 142, § 3º, X, da CF - 7

Asseverou-se que o art. 142, § 3º, X, da CF determina que os requisitos para o ingresso nas Forças

Armadas são os previstos em lei, com referência expressa ao critério de idade. Em virtude disso, não

caberia regulamentação por meio de outra espécie normativa. Assim, considerou-se incompatível com a

Constituição a expressão “e nos regulamentos da Marinha, do Exército e da Aeronáutica”, contida no art.

10 da Lei 6.880/80, que dispõe sobre o Estatuto dos Militares (“Art. 10 O ingresso nas Forças Armadas é

facultado mediante incorporação, matrícula ou nomeação, a todos os brasileiros que preencham os

requisitos estabelecidos em lei e nos regulamentos da marinha, do exército e da aeronáutica”).

Conferiram-se efeitos prospectivos à decisão, já que passados quase 22 anos de vigência da CF/88, nos

quais vários concursos foram realizados com observância daquela regra geral. Ademais, ao enfatizar a

repercussão geral da questão constitucional discutida, registrou-se que o direito daqueles que já tivessem

ajuizado ações com o mesmo objeto jurídico da que ora se examina deveria ser respeitado.

RE 600885/RS, rel. Min. Cármen Lúcia, 9.2.2011. (RE-600885)

(Informativo 615, Plenário)

Desapropriação

Decreto expropriatório e transmissão “mortis causa” - 3

Em conclusão, o Plenário, por maioria, denegou mandado de segurança impetrado contra ato do

Presidente da República que, por meio de decreto, declarara de interesse social, para fins de reforma

agrária, imóvel rural — v. Informativos 367 e 379. Ressaltou-se a necessidade de se interpretar o art.

1.784 em conjunto com o disposto no art. 1.791 e seu parágrafo único, ambos do Código Civil, de modo

que a saisine somente tornaria múltipla a titularidade do imóvel, o qual permaneceria uma única

propriedade até a partilha, unidade que não poderia ser afastada quando da apuração da área do imóvel

para fins de reforma agrária, razão por que não se poderia tomar cada parte ideal como propriedade

distinta. Salientou-se não ser aplicável, à espécie, o § 6º do art. 46 do Estatuto da Terra (Lei 4.504/64), já

que a expressão “para os fins desta Lei” nele contida teria o objetivo apenas de instrumentar o cálculo do

coeficiente de progressividade do Imposto Territorial Rural - ITR, não servindo o procedimento previsto

de parâmetro para o dimensionamento de imóveis rurais destinados à reforma agrária, matéria afeta à Lei

8.629/93. No que tange ao apontado erro de cálculo da área do imóvel, afirmou-se que, para os fins dessa

última lei, deveria ser levada em conta a área global, sem dedução das áreas não aproveitáveis e da

reserva legal (Lei 4.771/65, art. 16, § 2º), o que seria considerado somente no cálculo da produtividade do

imóvel (Lei 8.629/93, art. 6º). Com base nisso, e tendo em conta o laudo técnico do INCRA, considerouse

o imóvel em questão uma grande propriedade rural improdutiva passível de desapropriação.

Afastaram-se as demais alegações dos impetrantes, por considerar que demandariam dilação probatória,

incabível na via eleita.

MS 24924/DF, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o acórdão Min. Joaquim Barbosa,

24.2.2011. (MS-24924)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 617, Plenário)

Servidores Públicos

Remoção de servidor e ajuda de custo - 2

Em conclusão, o Plenário, por maioria, indeferiu mandado de segurança impetrado contra decisão

do TCU, que negara a servidor de seu quadro o direito à concessão de ajuda de custo, em razão de seu

retorno para a lotação de origem — v. Informativo 380. No caso, o servidor estava lotado inicialmente no

Estado da Paraíba e fora nomeado para exercer função comissionada no Estado do Acre, sendo

exonerado, de ofício, tempos depois. Seu retorno à lotação de origem fora deferido sem ônus para a Corte

de Contas. Reputou-se que, diante da circunstância de o recorrente haver sido destituído da função de

confiança e o seu regresso à origem ter se dado a seu pedido, não haveria direito à indenização. Ademais,

considerou-se inaplicável, à espécie, o Decreto 1.445/95 — com a redação dada pelo Decreto 1.637/95, o

qual regulamentava, à época dos fatos, a Lei 8.112/90 —, já que editado para reger relação do Poder

Executivo com o servidor. Vencidos os Ministros Joaquim Barbosa, relator, Dias Toffoli, Cármen Lúcia e

Ricardo Lewandowski que concediam a ordem.

MS 24089/DF, rel. orig. Min. Joaquim Barbosa, red. p/ o acórdão Min. Marco Aurélio,

24.2.2011. (MS-24089)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 617, Plenário)

Direito Constitucional

Controle de Constitucionalidade

ADPF e vinculação ao salário mínimo - 4

Em conclusão, o Plenário, por maioria, deferiu pedido de medida cautelar formulado em argüição de

descumprimento de preceito fundamental ajuizada pela Confederação Nacional de Saúde, Hospitais e

Estabelecimentos e Serviços – CNS contra o art. 16 da Lei 7.394/85, que estabelece que o salário mínimo

dos profissionais (técnicos em radiologia) que executam as técnicas definidas em seu art. 1º será

equivalente a 2 salários mínimos profissionais da região, incidindo sobre esses vencimentos 40% de risco

de vida e insalubridade — v. Informativo 611. Ao se reportar à orientação fixada no julgamento do RE

565714/SP (DJe de 7.11.2008), reputou-se, em princípio, que o art. 16 da Lei 7.394/85 seria incompatível

com art. 7º, IV, da CF, mas, a fim de evitar uma anomia, resolveu-se continuar aplicando os critérios

estabelecidos pela lei em questão, até que sobrevenha norma que fixe nova base de cálculo, seja lei

federal, editada pelo Congresso Nacional, sejam convenções ou acordos coletivos de trabalho, ou, ainda,

lei estadual, editada conforme delegação prevista na Lei Complementar 103/2000. Determinou-se, ainda,

o congelamento da base de cálculo em questão, para que seja calculada de acordo com o valor de 2

salários mínimos vigente na data do trânsito em julgado desta decisão, de modo a desindexar o salário

mínimo, valor este que deverá ser corrigido com base nos índices de reajustes de salários.

ADPF 151 MC/DF, rel. orig. Min. Joaquim Barbosa, red. p/ o acórdão Min. Gilmar Mendes,

2.2.2011. (ADPF-151)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 614, Plenário)

ADPF e vinculação ao salário mínimo - 5

Prevaleceu o voto do Min. Gilmar Mendes que, inicialmente, relembrou precedente do Tribunal no

qual apresentada distinção entre salário mínimo regional e piso salarial. Segundo o aresto, o salário

mínimo, nos termos do art. 7º, IV, da CF, haveria de ter valor único, já que as necessidades vitais básicas

do trabalhador e de sua família não variariam de acordo com a região do país, não sendo possível, assim,

que cada Estado-membro o fixasse por lei própria. Por outro lado, em relação ao piso salarial, o inciso V

desse mesmo dispositivo constitucional, ao se referir à respectiva extensão e complexidade, agasalharia a

consideração do próprio trabalho desenvolvido. Asseverou que a União, partindo dessa premissa, teria

editado a Lei Complementar 103/2000, que autorizou os Estados e o Distrito Federal a instituir, por meio

de lei de iniciativa do Poder Executivo, piso salarial para os empregados que não o tivessem definido em

lei federal, convenção ou acordo coletivo de trabalho. Verificou, entretanto, que os técnicos em radiologia

já possuíam piso salarial definido pelo preceito impugnado, razão por que a edição da citada Lei

Complementar não causaria impacto no piso salarial dessa categoria.

ADPF 151 MC/DF, rel. orig. Min. Joaquim Barbosa, red. p/ o acórdão Min. Gilmar Mendes,

2.2.2011. (ADPF-151)

(Informativo 614, Plenário)

ADPF e vinculação ao salário mínimo - 6

O Min. Gilmar Mendes registrou que a disciplina do piso salarial fixado pela Lei 7.394/85 teria sido

posteriormente alterada pelo art. 2º, § 1º, do Decreto-lei 2.351/87, que substituiu a vinculação ao salário

mínimo regional pela vinculação ao salário mínimo de referência, e pelo art. 5º da Lei 7.789/89, por meio

da qual teriam deixado de existir o salário mínimo de referência e o piso nacional de salários, passando a

vigorar apenas o salário mínimo. Afirmou que, a partir daí, o piso salarial dos radiologistas previsto na

Lei 7.394/85 teria passado a ser interpretado como de 2 salários mínimos. Destacou, a seguir, que a

Súmula Vinculante 4, por si só, não seria capaz de resolver a controvérsia, haja vista que, não obstante a

vedação do uso do salário mínimo como indexador, a discussão que dera origem ao verbete não se

referiria ao piso salarial, mas à base de cálculo do adicional de insalubridade, o qual, conforme disposto

no art. 192 da CLT e nas Súmulas 17 e 228 do TST, era o salário mínimo. Aduziu que isso seria

relevante, visto que uma interpretação sistemática do art. 7º, IV e V, da CF poderia levar à conclusão de

que este último inciso, ao viabilizar a fixação de piso salarial proporcional à extensão e à complexidade

do trabalho, seria uma exceção constitucional à norma que proíbe a vinculação ao salário mínimo para

qualquer fim. Citou, no entanto, a existência de diversos precedentes do STF no sentido da

impossibilidade de fixação de piso salarial com base em múltiplos do salário mínimo.

ADPF 151 MC/DF, rel. orig. Min. Joaquim Barbosa, red. p/ o acórdão Min. Gilmar Mendes,

2.2.2011. (ADPF-151)

(Informativo 614, Plenário)

ADPF e vinculação ao salário mínimo - 7

No que se tange ao adicional de insalubridade de 40%, constante da parte final do art. 16 da Lei

7.394/85, citou a Súmula Vinculante 4, já mencionada, editada diante da consolidada jurisprudência da

Corte segundo a qual o salário mínimo não pode ser utilizado como indexador de base de cálculo de

vantagem de servidor público ou de empregado. Por fim, entendeu aplicável, à espécie, a solução dada no

aludido julgamento do RE 565714/SP (DJe de 7.11.2008), no qual se julgara não recepcionado

dispositivo legal por violação ao 7º, IV, da CF, mas se reconhecera não ser da competência do Poder

Judiciário o estabelecimento de nova base de cálculo, sob pena de atuar como legislador positivo.

Vencidos o Min. Marco Aurélio, que deferia a cautelar em maior extensão, e os Ministros Joaquim

Barbosa, relator, e Ellen Gracie que a indeferiam. Alguns precedentes citados: ADI 2358 MC/RJ (DJU de

27.2.2004); RE 170203/GO (DJU de 15.4.94); AI 357477 AgR/PR (DJU de 14.10.2005); AI 277835

AgR/PR (DJe de 26.2.2010).

ADPF 151 MC/DF, rel. orig. Min. Joaquim Barbosa, red. p/ o acórdão Min. Gilmar Mendes,

2.2.2011. (ADPF-151)

(Informativo 614, Plenário)

Norma de trânsito e competência legislativa

O Plenário, por maioria, julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pela

Confederação Nacional do Transporte - CNT para declarar a inconstitucionalidade da Lei 6.457/93, do

Estado da Bahia, que determina a instalação de cinto de segurança em veículos de transporte coletivo de

passageiros. Reputou-se, conforme precedentes da Corte, violado o disposto no art. 22, XI, da CF (“Art.

22. Compete privativamente à União legislar sobre: ... XI - trânsito e transporte”). Vencido o Min.

Marco Aurélio que, por considerar a particularidade da norma discutida — voltada à segurança do

cidadão — entendia ser concorrente, entre Estado-membro e União, a competência legislativa atinente à

matéria e julgava improcedente o pleito.

ADI 874/BA, rel. Min. Gilmar Mendes, 3.2.2011. (ADI-874)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 614, Plenário)

ADI e limites de despesas com pagamento de pessoal - 1

O Plenário julgou parcialmente procedente pedido formulado em duas ações diretas propostas,

respectivamente, pela Associação dos Magistrados Brasileiros - AMB e pela Associação Nacional dos

Membros do Ministério Público - CONAMP para declarar, com efeitos ex tunc, a inconstitucionalidade

da expressão “e do Ministério Público Estadual”, contida no art. 6º da Lei 14.506/2009, do Estado do

Ceará, e da expressão “e Judiciário”, constante dos artigos 1º e 6º desse mesmo diploma legal. Declarouse,

ainda, a inconstitucionalidade parcial sem redução de texto dos demais dispositivos da citada lei para

afastar do seu âmbito de incidência o Poder Judiciário. A lei impugnada fixa, para o período

compreendido entre 1º de janeiro a 31 de dezembro de 2010, limites de despesa com a folha de

pagamento de pessoal e de encargos sociais no âmbito dos órgãos dos Poderes Executivo, Legislativo e

Judiciário e do Ministério Público estadual. Preliminarmente, afastou-se, por maioria, a alegação de

prejudicialidade das ações por perda superveniente de objeto. Considerou-se que as ações deveriam ser

conhecidas, apesar de a Lei 14.506/2009 ter eficácia limitada no tempo, tendo em vista duas

singularidades do caso. Asseverou-se, no ponto, ter havido impugnação em tempo adequado e sua

inclusão em pauta antes do exaurimento da eficácia da lei temporária em questão. Além disso, observouse

que, não obstante a lei questionada fazer referência a 31 de dezembro de 2010, fixando espaço

temporal para as limitações nela contidas, em razão do disposto em seu art. 7º (“Será considerada não

autorizada, irregular e lesiva ao patrimônio público a execução de despesa que não atenda o disposto

nesta Lei”), poderia haver efeitos em curso, ou seja, conseqüências para o futuro. Vencido, quanto à

citada preliminar, o Min. Marco Aurélio, que não conhecia das ações.

ADI 4426/CE, rel. Min. Dias Toffoli, 9.2.2011. (ADI-4426)

ADI 4356/CE, rel. Min. Dias Toffoli, 9.2.2011. (ADI-4356)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 615, Plenário)

ADI e limites de despesas com pagamento de pessoal - 2

Em seguida, a despeito de reputar as requerentes portadoras da legitimidade ativa para a propositura

das ações diretas de inconstitucionalidade, conheceu-se, parcialmente, das ações diretas por elas

ajuizadas, em razão de problemas de pertinência temática. Dessa forma, conheceu-se da ação ajuizada

pela CONAMP apenas quanto à expressão “e do Ministério Público Estadual”, contida no art. 6º da Lei

14.506/2009, por ela impugnado e, também, conheceu-se parcialmente da ação ajuizada pela AMB, de

modo a restringir o exame da validade da lei estadual ao que concerne ao Poder Judiciário. As demais

preliminares foram rejeitadas. No que tange ao mérito, vislumbrou-se violação à autonomia financeira do

Poder Judiciário e do Ministério Público do Estado do Ceará. Asseverou-se que, devidamente fixadas as

diretrizes gerais para a elaboração e a execução dos orçamentos do Estado — por meio da Lei de

Diretrizes Orçamentárias (Lei 14.416/2009, art. 1º, III), e estimadas a receita e a despesa do Estado para o

exercício financeiro de 2010, por meio da Lei Orçamentária Anual (Lei 14.608/2010) —, não poderia lei

ordinária, de iniciativa exclusiva do Poder Executivo, fixar limites de execução orçamentária sem

nenhuma participação do Poder Judiciário e do Ministério Público, por implicar indevida interferência

sobre a gestão orçamentária desses órgãos autônomos. Frisou-se que, em razão da autonomia do Poder

Judiciário e do Ministério Público na execução das despesas de seus respectivos orçamentos, somente os

próprios entes poderiam contingenciar as dotações orçamentárias que receberam, sendo ilegítima a

imposição de medidas nesse sentido pelo Executivo (CF, artigos 2º, 99, § 1º e 127, §§ 2º e 3º).

ADI 4426/CE, rel. Min. Dias Toffoli, 9.2.2011. (ADI-4426)

ADI 4356/CE, rel. Min. Dias Toffoli, 9.2.2011. (ADI-4356)

(Informativo 615, Plenário)

ADI e vício de iniciativa

Por reputar usurpada a competência privativa do Chefe do Poder Executivo para iniciar projeto de

lei que verse sobre regime jurídico e provimento de cargos de servidores públicos (CF, art. 61, § 1º, II, a e

c), o Plenário julgou procedente pedido formulado em ação direta ajuizada pelo Governador do Estado do

Espírito Santo para declarar a inconstitucionalidade da Lei 7.341/2002, daquele ente federado. O

mencionado diploma legal, de iniciativa parlamentar, estabelecia a graduação em nível superior de ensino

como requisito essencial para a inscrição em concurso público para o cargo de Agente de Polícia Civil

Estadual.

ADI 2856/ES, rel. Min. Gilmar Mendes, 10.2.2011. (ADI-2856)

ADI 4356/CE, rel. Min. Dias Toffoli, 9.2.2011. (ADI-4356)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 615, Plenário)

ICMS e salvados - 4

Em conclusão, o Plenário, por maioria, julgou parcialmente procedente pedido formulado em ação

direta ajuizada pela Confederação Nacional do Comércio para declarar a inconstitucionalidade da

expressão “e a seguradora”, constante do inciso IV do art. 15 da Lei 6.763/75, na redação dada pelo art.

1º da Lei 9.758/89, ambas do Estado de Minas Gerais (“Art. 15 Incluem-se entre os contribuintes do

imposto: ... IV - a instituição financeira e a seguradora”) — v. Informativos 283, 419 e 478. Entendeu-se

que as vendas de salvados pelas companhias seguradoras constituiriam atividade integrante das operações

de seguro, cuja tributação se sujeitaria à competência da União (CF, art. 153, V), não se enquadrando tais

vendas, ainda, no conceito de operações relativas à circulação de mercadorias. Vencidos os Ministros

Nelson Jobim, Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa e Ayres Britto que julgavam o pleito

improcedente. Reformularam os votos proferidos anteriormente os Ministros Joaquim Barbosa e Ayres

Britto.

ADI 1648/MG, rel. Min. Gilmar Mendes, 16.2.2011. (ADI-1648)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 616, Plenário)

Remoção de titular de serventia extrajudicial - 1

Por vislumbrar afronta ao art. 236, § 3º, da CF, o Plenário julgou procedente pedido formulado em

duas ações diretas propostas, respectivamente, pelo Procurador-Geral da República e pela Associação dos

Magistrados Brasileiros - AMB para declarar, com efeitos ex tunc, a inconstitucionalidade do art. 299,

inserido no Código de Organização e Divisão Judiciárias do Estado do Paraná, pela Lei estadual

14.351/2004 (“Art. 299. O agente delegado, ingressado no concurso na forma do disposto pelo § 3º do

art. 236, da Constituição Federal, que esteja respondendo por diferente delegação, poderá ser para esta

última removido com a aprovação do conselho da magistratura, assim o requerendo, comprovada: a) a

baixa rentabilidade da serventia para a qual recebeu a delegação; b) que a designação perdure por dois

anos ou mais; c) a vacância da serventia a ser preenchida”). Inicialmente, quanto ao argumento da boafé

dos que ocuparam as serventias pelos critérios expostos, observou-se que o Governador, à época,

vetara o referido artigo sob a justificativa de que, como estava posto, ensejaria via de provimento sem o

respectivo concurso exigido pela Carta Magna. Assinalou-se que a Assembléia Legislativa local, mesmo

assim, decidira derrubar o veto. Assentou-se, então, que os serventuários removidos o fizeram por sua

conta e risco. Em seguida, reputou-se que o dispositivo adversado confiaria à discricionariedade do

conselho da magistratura local a aprovação de requerimento formulado pelo interessado na remoção, sem

fazer qualquer referência à realização de concurso público para tanto.

ADI 3248/PR, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 23.2.2011. (ADI-3248)

ADI 3253/PR, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 23.2.2011. (ADI-3253)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 617, Plenário)

Remoção de titular de serventia extrajudicial - 2

Enfatizou-se que, na hipótese de provimento derivado de serventia vaga, forçosamente, deveria ser

aberto concurso de remoção. Explicitou-se que o aventado art. 299 traria critérios de caráter discricionário

incompatíveis com o teor da Constituição, inclusive em afronta ao princípio da isonomia. Ressaltou-se,

por fim, que a declaração de inconstitucionalidade não excluiria a necessidade de confirmação dos atos

praticados pelos notários ou registradores removidos com base no dispositivo inconstitucional até o

ingresso de serventuário removido após a realização de concurso. Nesse sentido, com fundamento na

aparência de legalidade dos atos por eles praticados, dever-se-iam respeitar os efeitos que atingiram

terceiros de boa-fé.

ADI 3248/PR, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 23.2.2011. (ADI-3248)

ADI 3253/PR, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 23.2.2011. (ADI-3253)

(Informativo 617, Plenário)

Concurso público: títulos classificatórios e princípio da isonomia

O Plenário julgou improcedente pedido formulado em ação direta de inconstitucionalidade proposta

pelo Partido Progressista contra os incisos IV a IX, XII e XIII do art. 16 da Lei 11.183/98, do Estado do

Rio Grande do Sul, que dispõem sobre os critérios de valorização de títulos para concursos de ingresso e

remoção nos serviços notarial e de registro. Alegava o requerente que as mencionadas normas, ao valorar

apenas títulos diretamente relacionados à função notarial ou de registro e ao desempenho profissional

anterior de atividades concernentes às áreas de advocacia, judicatura e promotoria, violariam o princípio

da isonomia, conferindo aos integrantes dessas categorias profissionais vantagem indevida em relação aos

demais candidatos. Considerou-se que, por se tratar de critérios ligados à função notarial ou de registro,

eles seriam razoáveis, na medida em que buscariam arregimentar os melhores para os cargos e funções

ofertados.

ADI 3830/RS, rel. Min. Marco Aurélio, 23.2.2011. (ADI-3830)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 617, Plenário)

Processo seletivo de estagiários e entidades do Poder Público

O Plenário julgou procedente pedido formulado em ação direta proposta pela então Governadora do

Distrito Federal para declarar a inconstitucionalidade do art. 4º da Lei distrital 3.769/2006. O preceito

impugnado dispõe sobre o estágio de estudantes nos órgãos e entidades da Administração Pública do

Distrito Federal. Salientou-se, de início, que a arregimentação de estagiários não poderia ser vista como

alternativa menos onerosa para se suprir eventual carência de mão-de-obra no quadro funcional da

Administração Pública. Aduziu-se, ademais, que o processo meritoriamente seletivo conferiria concreção

ao princípio da impessoalidade e permitiria o tratamento isonômico dos interessados no certame.

Concluiu-se que o dispositivo adversado seria materialmente contrário à Constituição. Os Ministros Dias

Toffoli, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Marco Aurélio, Celso de Mello e Cezar Peluso,

Presidente, assentavam também o vício de iniciativa ao fundamento de que o artigo em questão, de

iniciativa parlamentar, implicaria interferência no desempenho de atribuições e no próprio funcionamento

dos órgãos do Poder Executivo.

ADI 3795/DF, rel. Min. Ayres Britto, 24.2.2011. (ADI-3795)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 617, Plenário)

Juiz de Paz: remuneração e custas para habilitação de casamento

A remuneração dos Juízes de Paz somente pode ser fixada em lei de iniciativa exclusiva do Tribunal

de Justiça Estadual. Com base nesse entendimento, o Plenário julgou procedente pedido formulado em

ação direta ajuizada pelo Procurador Geral da República para declarar a inconstitucionalidade da

expressão “recolhidas à disposição do Juiz de Paz”, contida no parágrafo único do art. 2º da Lei mineira

10.180/90, de iniciativa do Governador do Estado de Minas Gerais. O preceito impugnado, ao alterar a

redação de dispositivos da Lei mineira 7.399/78 (Regimento de Custas do Estado de Minas Gerais),

determina que as custas cobradas para o processo de habilitação de casamento sejam recolhidas à

disposição do Juiz de Paz. Entendeu-se que a lei impugnada estaria em confronto com a alínea b do inciso

II do art. 96 da CF que prevê competência privativa ao STF, aos Tribunais Superiores e aos Tribunais de

Justiça propor ao Poder Legislativo respectivo, observado o disposto no art. 169, a remuneração dos seus

serviços auxiliares e dos juízos que lhes forem vinculados, bem como a fixação do subsídio de seus

membros e dos juízes, inclusive dos tribunais inferiores, onde houver. Considerou-se, ainda, que a norma

questionada também incorreria em vício material, haja vista que os Juízes de Paz, por serem agentes

públicos, que exercem atividade eminentemente estatal, deveriam ser pagos pelos cofres públicos. Precedente

citado: ADI 1051/SC (DJU de 13.10.95).

ADI 954/MG, rel. Min. Gilmar Mendes, 24.2.2011. (ADI-954)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 617, Plenário)

DIREITO PENAL

Livramento Condicional

Livramento condicional e crime superveniente

A 2ª Turma concedeu habeas corpus para determinar que o paciente retorne ao livramento

condicional com a ressalva de que, cumprido o período de prova, a decisão de extinção da pena somente

poderá ser proferida após o trânsito em julgado referente ao crime superveniente (CP: “Art. 89 O juiz não

poderá declarar extinta a pena, enquanto não passar em julgado a sentença em processo a que responde

o liberado, por crime cometido na vigência do livramento”). Na situação dos autos, a defesa sustentava

falta de fundamentação da decisão que suspendera o benefício do livramento condicional e que, a

despeito da prática de crime no curso do período de prova, a eventual prisão do liberado somente se

justificaria se motivada, o que não teria ocorrido. Entendeu-se que, de fato, a prática de outro delito

durante o período de prova do livramento condicional autorizaria a suspensão cautelar do benefício, nos

termos do art. 145 da Lei de Execução Penal - LEP e do art. 732 do CPP. Entretanto, aduziu-se que o

juízo das execuções não se desincumbira de demonstrar a real necessidade de se determinar a segregação

do paciente, bem como que a ele caberia fundamentar a sua imprescindibilidade, sob pena de torná-la

medida automática, consectário lógico da prática de novo crime durante o período de prova do benefício.

Por fim, considerou-se que a espécie amoldar-se-ia à hipótese de prorrogação do livramento condicional.

Ao acolher proposta formulada pelo Min. Ayres Britto, a 2ª Turma deliberou afetar ao Plenário

julgamento de habeas corpus em que se discute a constitucionalidade, ou não, da vedação abstrata da

liberdade provisória prevista no art. 44 da Lei 11.343/2006, bem como o excesso de prazo para o

encerramento da instrução criminal.

HC 105497/RJ, rel. Min. Gilmar Mendes, 15.2.2011. (HC-105497)

(Informativo 616, 2ª Turma)

Penas

Lei 8.072/90 e regime inicial de cumprimento de pena - 1

A 2ª Turma concedeu habeas corpus para determinar ao juízo da execução que proceda ao exame

da possibilidade de substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos ou, no caso de o

paciente não preencher os requisitos, que modifique o regime de cumprimento da pena para o aberto. Na

situação dos autos, o magistrado de primeiro grau condenara o paciente à pena de 1 ano e 8 meses de

reclusão, a ser cumprida no regime inicialmente fechado, nos termos do art. 2º, § 1º, da Lei 8.072/90 (Lei

dos Crimes Hediondos), com a redação dada pela Lei 11.464/2007 (“Art. 2º Os crimes hediondos, a

prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins e o terrorismo são insuscetíveis de: §

1º A pena por crime previsto neste artigo será cumprida inicialmente em regime fechado”). Observou-se,

em princípio, que o Supremo declarara, incidenter tantum, a inconstitucionalidade da antiga redação do

art. 2º, § 1º, da Lei 8.072/90, em que se estabelecia o regime integralmente fechado para o cumprimento

das penas por crimes previstos naquela norma. Consignou-se, ainda, que a nova redação do aludido

dispositivo estaria sendo alvo de debates nas instâncias inferiores e que o STJ concluíra por sua

inconstitucionalidade, ao fundamento de que, a despeito das modificações preconizadas pela Lei

11.464/2007, persistiria a ofensa ao princípio constitucional da individualização da pena e, também, da

proporcionalidade.

HC 105779/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 8.2.2011. (HC-105779)

(Informativo 615, 2ª Turma)

Lei 8.072/90 e regime inicial de cumprimento de pena - 2

Em seguida, considerou-se que deveria ser superado o disposto na Lei dos Crimes Hediondos

quanto à obrigatoriedade do início de cumprimento de pena no regime fechado, porquanto o paciente

preencheria os requisitos previstos no art. 33, § 2º, c, do CP. Aduziu-se, para tanto, que a decisão

formalizada pelo magistrado de primeiro grau: 1) assentara a não reincidência do condenado e a ausência

de circunstâncias a ele desfavoráveis; 2) reconhecera a sua primariedade; e 3) aplicara reprimenda inferior

a 4 anos. No que concerne ao pedido de substituição da pena por restritiva de direitos, registrou-se que o

Plenário desta Corte declarara incidentalmente a inconstitucionalidade da expressão “vedada a conversão

em penas restritivas de direitos”, constante do § 4º do art. 33 da Lei 11.343/2006, e da expressão “vedada

a conversão de suas penas em restritivas de direitos”, contida no referido art. 44 do mesmo diploma

legal. Alguns precedentes citados: HC 82959/SP (DJU de 1º.9.2006); HC 97256/RS (DJe de 16.12.2010).

HC 105779/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 8.2.2011. (HC-105779)

(Informativo 615, 2ª Turma)

HC: liberdade provisória e prejudicialidade

A 1ª Turma, por maioria, julgou prejudicado, em parte, habeas corpus em que se pleiteava a

redução da pena no patamar máximo previsto no art. 33, § 4º, da Lei 11.343/2006, bem como a

substituição da reprimenda por restritiva de direitos ou a concessão de sursis. Na espécie, o paciente fora

condenado a pena inferior a 2 anos de reclusão. Inicialmente, ressaltou-se que, embora o paciente tivesse

jus à substituição da pena corporal pela restritiva de direitos, ele estaria em liberdade condicional desde

4.2.2010, o que configuraria situação mais favorável do que a pretendida neste writ. Enfatizou-se que,

agora, o cumprimento da reprimenda restritiva de direito, ainda que pelo prazo remanescente de eventual

parte daquela corporal, afigurar-se-ia mais gravoso ao condenado. Em seguida, denegou-se a ordem

quanto à análise da dosimetria. No ponto, reputou-se que o reexame seria vedado na via eleita, porquanto

consistiria no revolvimento de prova. Ademais, observou-se que o tribunal de justiça estadual, ao proferir

decisão mais favorável do que a sentença de 1º grau, reduzira a pena de maneira fundamentada, respeitara

o princípio da individualização e atendera aos requisitos legais, fundando-se nas circunstâncias indicadas

no art. 42 do referido diploma. Vencido o Min. Marco Aurélio que afastava o prejuízo da impetração e

concedia a ordem para aplicar o art. 44 do CP, consubstanciado na Lei 11.343/2006.

HC 102547/MG, rel. Min. Dias Toffoli, 15.2.2011. (HC-102547)

(Informativo 616, 1ª Turma)

Princípios e Garantias Penais

Art. 229 do CP e princípio da adequação social

Não compete ao órgão julgador descriminalizar conduta tipificada formal e materialmente pela

legislação penal. Com esse entendimento, a 1ª Turma indeferiu habeas corpus impetrado em favor de

condenados pela prática do crime descrito na antiga redação do art. 229 do CP [“Manter, por conta

própria ou de terceiro, casa de prostituição ou lugar destinado a encontros para fim libidinoso, haja ou

não intuito de lucro ou mediação direta do proprietário ou gerente: Pena - reclusão, de 2 (dois) a 5

(cinco) anos, e multa.”]. A defesa sustentava que, de acordo com os princípios da fragmentariedade e da

adequação social, a conduta perpetrada seria materialmente atípica, visto que, conforme alegado, o caráter

criminoso do fato estaria superado, por força dos costumes. Aduziu-se, inicialmente, que os bens jurídicos

protegidos pela norma em questão seriam relevantes, razão pela qual imprescindível a tutela penal.

Ademais, destacou-se que a alteração legislativa promovida pela Lei 12.015/2009 teria mantido a

tipicidade da conduta imputada aos pacientes. Por fim, afirmou-se que caberia somente ao legislador o

papel de revogar ou modificar a lei penal em vigor, de modo que inaplicável o princípio da adequação

social ao caso.

HC 104467/RS, rel. Min. Cármen Lúcia, 8.2.2011. (HC-104467)

(Informativo 615, 1ª Turma)

Princípio da insignificância e usuário de drogas - 2

Em conclusão, a 1ª Turma, ao resolver questão de ordem, julgou prejudicado habeas corpus no qual

se pretendia, mediante a aplicação do princípio da insignificância, o reconhecimento da atipicidade

material da conduta do paciente — surpreendido na posse de 0,5 grama de maconha — v. Informativo

597. Verificou-se que, na instância de origem, fora proferida sentença que reconhecera a prescrição da

pretensão punitiva do Estado e, conseqüentemente, extinguira a punibilidade do réu. Reajustou o voto o

Min. Ricardo Lewandowski, relator.

HC 102940/ES, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 15.2.2011. (HC-102940)

(Informativo 616, 1ª Turma)

Tipicidade Penal

Elemento subjetivo do tipo: seqüestro e roubo de veículos

Ante o empate na votação, a 1ª Turma deferiu habeas corpus, de ofício, para excluir, da condenação

do paciente, a pena relativa ao crime de seqüestro. Tratava-se, na espécie, de recurso ordinário em habeas

corpus interposto em favor de condenado pela prática dos delitos de quadrilha armada, roubo qualificado,

seqüestro e cárcere privado. A defesa requeria o reconhecimento: a) da continuidade delitiva em relação

aos crimes de roubo praticados pelo paciente, afastado o concurso material imposto pelo tribunal de

justiça local; b) da tese de que a condenação pelo crime de roubo qualificado pelo emprego de arma e por

crime de formação de quadrilha armada consistiria em bis in idem; c) da atipicidade do crime de

seqüestro. Prevaleceu o voto proferido pelo Min. Dias Toffoli, relator, que, inicialmente, não conheceu do

recurso. No tocante ao primeiro argumento, aduziu que o exame do tema demandaria o revolvimento de

matéria fática, incabível na sede eleita. Rejeitou o alegado bis in idem, dada a autonomia do crime de

quadrilha ou bando. No que concerne à última assertiva, registrou que a questão não fora apreciada na

origem. Contudo, vislumbrou a possibilidade da concessão da ordem de ofício. Asseverou que os crimes

de seqüestro e cárcere privado imputados ao recorrente na denúncia, na realidade, tiveram escopo único,

exclusivamente voltado à consumação do crime de roubo de veículos automotores, ainda que a privação

de liberdade das vítimas tivesse ocorrido por razoável período de tempo. Enfatizou que estas teriam sido

colocadas espontaneamente em liberdade pelos criminosos, tão-logo assegurada a posse mansa e pacífica

da res furtiva. Em razão disso, considerou não caracterizado o crime de seqüestro por ausência do

elemento subjetivo do tipo. Os Ministros Ricardo Lewandowski e Cármen Lúcia votaram pela não

concessão, de ofício, do writ

RHC 102984/RJ, rel. Min. Dias Toffoli, 8.2.2011. (RHC-102984)

(Informativo 615, 1ª Turma)

DIREITO PROCESSUAL CIVIL

Direito de Vista

Ausência de procuração e vista dos autos

O art. 7º, XIII, da Lei 8.906/94 (Estatuto dos Advogados) assegura ao advogado o direito de

examinar, em qualquer órgão dos Poderes Judiciário e Legislativo, ou da Administração Pública em geral,

autos de processos findos ou em andamento, mesmo sem procuração, quando não estejam sujeitos a

sigilo, assegurada a obtenção de cópias, podendo tomar apontamentos. Nesse sentido, o Plenário, tendo

em conta não se tratar de processo sigiloso, concedeu mandado de segurança impetrado contra decisão do

Tribunal de Contas da União - TCU, que indeferira requerimento de vista e cópia integral de processo a

advogado, em razão da inexistência de procuração a ele outorgada. Precedente citado: MS 23527 MC/DF

(DJU de 4.2.2002).

MS 26772/DF, rel. Min. Gilmar Mendes, 3.2.2011. (MS-26772)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 614, Plenário)

Legitimidade

Legitimidade do Ministério Público: ação civil pública e patrimônio público municipal - 4

O Ministério Público possui legitimidade ativa ad causam para promover ação civil pública em

defesa do patrimônio público, nos termos do art. 129, III, da CF. Essa a conclusão do Plenário ao prover,

por maioria, recurso extraordinário, a ele afetado pela 2ª Turma, interposto contra acórdão que mantivera

sentença que indeferira liminarmente petição inicial de parquet estadual, por entender que o dispositivo

constitucional em comento não dera à ação civil pública a amplitude pretendida pelo órgão ministerial —

v. Informativo 567. Considerou-se que haveria de ser mantida a jurisprudência do STF no sentido de que,

depois da promulgação da Constituição Federal de 1988, especialmente em razão do alcance que deve ser

conferido à norma contida em seu art. 129, III, o Ministério Público está legitimado para ajuizar ações

civis públicas para a proteção do patrimônio público, podendo postular, inclusive, a reparação direta do

dano eventualmente causado a ente da Administração Pública. O Min. Dias Toffoli destacou, em seu

voto-vista, que seria extremamente relevante o reconhecimento da legitimidade do Ministério Público,

sobretudo por não haver, na maioria dos Municípios, procuradoria de advocacia pública instituída.

Asseverou, no ponto, que a Constituição Federal teria determinado a obrigatoriedade da advocacia

pública federal e estadual, mas não a municipal, a qual poderia dar maiores condições para que os

Municípios atuassem em juízo. Vencidos os Ministros Eros Grau, relator, e Cezar Peluso, Presidente, que

desproviam o recurso, ao fundamento de que o Ministério Público não teria legitimidade para exigir, em

ação civil pública, o que poderia vir a ser objeto de ação popular (CF, art. 5º, LXXIII).

RE 225777/MG, rel. orig. Min. Eros Grau, red. p/ o acórdão Min. Dias Toffoli, 24.2.2011. (RE-

225777)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 617, Plenário)

Reclamação e legitimidade de Ministério Público estadual - 3

O Plenário concluiu julgamento de reclamação ajuizada pelo Ministério Público do Estado de São

Paulo contra acórdão que provera agravo de execução interposto em favor de condenado preso para

restabelecer seu direito à remição dos dias trabalhados, cuja perda fora decretada em razão do

cometimento de falta grave. Sustentava o reclamante violação ao Enunciado da Súmula Vinculante 9 [“O

disposto no artigo 127 da Lei nº 7.210/1984 (Lei de Execução Penal) foi recebido pela ordem

constitucional vigente, e não se lhe aplica o limite temporal previsto no caput do artigo 58”] — v.

Informativo 580. Inicialmente, por maioria, reconheceu-se a legitimidade ativa autônoma do Ministério

Público estadual para propor reclamação perante o STF. O Min. Marco Aurélio considerou que, como o

parquet estadual atuara na 1ª e na 2ª instâncias, ao vislumbrar desrespeito ao citado verbete, seria ele

parte legítima na reclamação perante o Supremo. Assinalou que não haveria como se conceber a confusão

do Ministério Público quando atuasse como parte e como fiscal da lei. O Min. Celso de Mello assentou

que o Ministério Público do Trabalho não disporia dessa legitimidade por uma singularidade, qual seja, a

de integrar o Ministério Público da União, cujo chefe é o Procurador-Geral da República. Aduziu que,

entretanto, não existiria qualquer relação de dependência entre o Ministério Público da União e o dos

Estados-membros. Acentuou que estabelecer uma situação de subalternidade implicaria descaracterizar o

próprio modelo federal de Estado, porque se estaria virtualmente, em sede jurisdicional, a transformar, em

termos de Ministério Público, o Estado brasileiro em verdadeiro Estado unitário, em que as deliberações

emanariam do órgão central do sistema, que seria o Procurador-Geral da República. Acrescentou que,

muitas vezes, inclusive, os Ministérios Públicos estaduais poderiam formular representação perante o

STF, deduzindo pretensão com a qual não concordasse, eventualmente, a chefia do Ministério Público da

União, o que obstaria o acesso do parquet local no controle do respeito e observância, por exemplo, de

súmulas impregnadas de eficácia vinculante.

Rcl 7358/SP, rel. Min. Ellen Gracie, 24.2.2011. (RCL-7358)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 617, Plenário)

Reclamação e legitimidade de Ministério Público estadual - 4

O Min. Cezar Peluso, por sua vez, ressaltou que fazer com que o Ministério Público estadual ficasse

na dependência do que viesse a entender o Ministério Público Federal seria incompatível, dentre outros

princípios, com o da paridade de armas. Disse, ademais, que se estaria retirando do Ministério Público

estadual uma legitimidade que seria essencial para o exercício das suas funções, as quais não seriam

exercidas pelo Ministério Público Federal. Ponderou, ainda, que a orientação segundo a qual só o

Procurador-Geral da República poderia atuar perante o STF estaria disciplinada na Lei Complementar

75/93, em um capítulo que só cuidaria do Ministério Público da União, e que o art. 46 dessa lei,

específico desse capítulo, estabeleceria incumbir ao Procurador-Geral da República as funções de custos

legis e as do Ministério Público Federal perante o STF, mas não as funções de qualquer Ministério

Público como parte. O Min. Ayres Britto, ao incorporar em seu voto os mencionados fundamentos,

entendeu que a Carta Federal estruturaria o Ministério Público sob a forma de instituição-gênero, dividida

em duas espécies: o da União, subdividido em ramos, e o dos Estados, unitariamente concebido.

Comunicaria, ou estenderia, a ambas os mesmos traços de permanência, da sua essencialidade em face da

função jurisdicional do Estado, assim como da submissão aos princípios da unidade, indivisibilidade e

independência, além de autonomia funcional e administrativa (CF, art. 127, caput e §§ 1º e 2º). Aduziu

que a Lei Maior, também, erigiria toda a ordem jurídica como a primeira das finalidades do Ministério

Público e incumbiria a ele defendê-la. Salientou haver um vínculo necessário entre o instituto da

reclamação e a defesa da ordem jurídica, a viabilizar o manejo da ação pelo órgão ministerial enquanto

instituição-gênero. Assim, observou não haver distinção de qualidade entre o Ministério Público da União

e o dos Estados, por serem a eles comuns tanto as finalidades quanto as competências previstas,

respectivamente, nos artigos 127 e 129 da CF. Registrou que, aos Ministérios Públicos estaduais,

competiria velar pela defesa da competência e pela autoridade das decisões do STF nas respectivas

unidades federadas. Vencidos, no ponto, os Ministros Ellen Gracie, relatora, Dias Toffoli, Cármen Lúcia

e Joaquim Barbosa, que deferiam a admissão do Procurador-Geral da República como autor da demanda,

ao fundamento de que o parquet estadual não possuiria legitimidade para propor originariamente

reclamação no STF. Consideravam, entretanto, que a ilegitimidade fora corrigida pelo Procurador-Geral,

que ratificara a petição inicial.

Rcl 7358/SP, rel. Min. Ellen Gracie, 24.2.2011. (RCL-7358)

(Informativo 617, Plenário)

Reclamação e legitimidade de Ministério Público estadual - 5

No mérito, por maioria, julgou-se procedente a reclamação para cassar o acórdão adversado.

Esclareceu-se que o julgamento do agravo ocorrera em data posterior à edição da Súmula, o que

expressamente reconhecido pela Corte estadual. Reputou-se incorreto o fundamento de que ela não seria

vinculante em razão de ser anterior a data da falta grave. Consignou-se, ainda, que a súmula se destinaria

à obediência pelos órgãos do Poder Judiciário e, por conseguinte, como a decisão impugnada seria

posterior à sua edição, forçosamente, haveria de respeitá-la. O Min. Gilmar Mendes observou que, se a

súmula só fosse aplicada a fatos que ocorressem a partir dela, esvaziar-se-ia boa parte de seu efeito útil.

Vencidos os Ministros Celso de Mello e Marco Aurélio que a julgavam improcedente, ao fundamento de

se tratar de matéria penal e de os fatos configuradores da falta disciplinar terem ocorrido antes da

formulação sumular.

Rcl 7358/SP, rel. Min. Ellen Gracie, 24.2.2011. (RCL-7358)

(Informativo 617, Plenário)

Recursos

Repercussão geral e sobrestamento

A 1ª Turma, por maioria, acolheu segundos embargos de declaração para sobrestar recurso

extraordinário até o julgamento do AI 768491-RG/RS, em que reconhecida a repercussão geral da questão

constitucional discutida nos autos. Entendeu-se que, uma vez admitida a repercussão geral e submetida ao

Plenário, dever-se-iam sobrestar os processos em que debatida a mesma matéria. Vencido o Min. Ricardo

Lewandowski, relator, que reputava não preenchidos os requisitos de embargabilidade, bem como

desnecessário o sobrestamento, pois o agravo regimental fora julgado antes do reconhecimento da

repercussão geral.

RE 511696 AgR-ED-ED/MG, rel. orig. Min. Ricardo Lewandowski, red. p/ o acórdão Min.

Marco Aurélio, 1º.2.2011. (RE-511696)

(Informativo 614, 1ª Turma)

DIREITO PROCESSUAL PENAL

Ação Penal

Ação penal: reautuação e novo recebimento de denúncia no STF

Por constatar a materialidade e indícios de autoria, o Plenário, em votação majoritária, recebeu

denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal contra Deputada Federal pela suposta prática do crime

previsto no art. 293, § 1º, do CP, consistente na utilização de selos falsos de IPI. Relata a denúncia que a

parlamentar e outros 13 investigados seriam sócios, gerentes e administradores de empresas com

atividades voltadas para a fabricação, comercialização, distribuição e transporte de cigarros, que obteriam

lucros vultosos mediante a prática de vários delitos. De início, tendo em conta peculiaridades, rejeitou-se

a preliminar, suscitada pelo Min. Marco Aurélio, de validade do recebimento da denúncia em 1º grau.

Considerou-se, sobretudo, o fato de que, apesar de ter havido recebimento da denúncia em 1ª instância, a

acusada teria sido diplomada entre a data da assinatura do despacho de recebimento da inicial acusatória e

a data de sua publicação em cartório, momento este em que o juízo não seria mais competente para julgar

a parlamentar. Frisou-se, também, que a própria defesa da acusada pedira a reautuação dos autos como

inquérito perante o STF, e que haveria manifestação da Procuradoria Geral da República no sentido de

concordar com esse pleito. Registrou-se, ainda, que o rito fora reaberto, possibilitando-se a defesa prévia,

e que não teria havido prejuízo para a acusada, já que o recebimento da denúncia na origem

provavelmente teria sido, inclusive, em maior extensão. Vencido, no ponto, o Ministro Marco Aurélio,

que considerava ter-se ato formalizado, não afastado do cenário jurídico e praticado por autoridade

competente, ou seja, o juízo, já que a acusada não gozava, à época, de prerrogativa de foro. Reputava que

o recebimento da denúncia se dera antes da diplomação, e que o ato deveria ser considerado na data em

que formalizado e não na da ciência à parte. Consignou, por fim, não estar sensibilizado com a

concordância das partes, por ser o direito instrumental imperativo, e de não se tratar de perquirir, em si, o

prejuízo, ou não, mas de se verificar se o figurino instrumental estaria sendo respeitado. Rejeitou-se,

ainda, por unanimidade, a denúncia quanto ao crime de lavagem de dinheiro (Lei 9.613/98, art. 1º, VII), e,

por maioria, quanto ao crime de quadrilha ou bando (CP, art. 288).

Inq 2786/RJ, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 17.2.2011.(Inq-2786)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 616, Plenário)

Habeas Corpus

HC e estrangeiro não domiciliado no Brasil - 1

Por reputar ausentes os requisitos de embargabilidade, a 2ª Turma rejeitou embargos de declaração

em que pretendido o aclaramento sobre a admissibilidade de habeas corpus, bem como questão de ordem

neles formulada. Tratava-se, na espécie, de embargos declaratórios opostos contra acórdão proferido em

habeas corpus no qual se decidira que: a) o súdito estrangeiro, mesmo o não domiciliado no Brasil, teria

plena legitimidade para impetrar habeas corpus, em ordem a tornar efetivo, nas hipóteses de persecução

penal, o direito subjetivo, de que também seria titular, à observância e ao integral respeito, por parte do

Estado, das prerrogativas que compõem e dão significado à cláusula do devido processo legal; b) seria

inviável a execução do Acordo de Cooperação Brasil/Rússia, presente o contexto em exame, resultar em

imediata aplicação, em território brasileiro, em detrimento do paciente — que sequer se encontraria no

Brasil —, de qualquer medida privativa de sua liberdade de locomoção física; c) haveria impossibilidade

jurídica de o STF expedir provimentos jurisdicionais consubstanciadores de ordens mandamentais

dirigidas a qualquer missão diplomática sediada em território brasileiro. Na ocasião, buscava-se ordem

mandamental a ser dirigida à Missão Diplomática da Federação da Rússia, para que a Federação da

Rússia devolvesse o material informativo a ela encaminhado pela Procuradoria Geral da República do

Brasil e que teria, como destinatária específica, a Procuradoria Geral da República da Federação da

Rússia.

HC 102041 ED/SP, rel. Min. Celso de Mello, 15.2.2011. (HC-102041)

(Informativo 616, 2ª Turma)

HC e estrangeiro não domiciliado no Brasil - 2

Entendeu-se que os embargos opostos teriam nítido caráter infringente, circunstância que, por si só,

bastaria para tornar incabível a espécie recursal ora em análise. Asseverou-se que o acórdão embargado

não teria afastado a possibilidade de utilização do remédio do habeas corpus, mesmo nas hipóteses de

cooperação jurídica internacional, em que o auxílio direto constituiria modalidade, desde que presentes,

no entanto, quanto ao writ, os requisitos de sua admissibilidade. Aduziu-se, apenas, a inviabilidade, no

caso específico, de utilização do habeas, uma vez que ausente do território brasileiro a pessoa do súdito

estrangeiro em questão e, por isso, inexistente qualquer possibilidade de dano atual ou iminente à

liberdade ou à locomoção física do paciente.

HC 102041 ED/SP, rel. Min. Celso de Mello, 15.2.2011. (HC-102041)

(Informativo 616, 2ª Turma)

Nulidades

Excesso de linguagem na pronúncia e oitiva de testemunhas

A 2ª Turma concedeu, em parte, habeas corpus para anular sentença de pronúncia, a ser

desentranhada dos autos de origem, devendo outra ser proferida pelo juiz da causa. Tratava-se, na espécie,

de writ impetrado em favor de pronunciado pelo crime de homicídio qualificado. Alegava-se que, ao

pronunciar o paciente, o magistrado afirmara a autoria do acusado no crime, o que poderia influenciar

negativamente os jurados. Sustentava-se, ainda, que o juiz encerrara a instrução antes do término do prazo

fixado para o cumprimento das cartas precatórias expedidas para a oitiva das testemunhas arroladas pelo

réu, as quais somente teriam sido juntadas após as alegações finais das partes. Quanto ao primeiro

argumento, entendeu-se que o magistrado, na pronúncia, de fato fizera afirmações no sentido de ser o

paciente o autor do delito a ele imputado, não se limitando, portanto, a indicar a existência de indícios

suficientes quanto à autoria ou participação no crime. Considerou-se, ademais, que a mera exclusão das

expressões tidas como excessivas poderia descontextualizar a redação da pronúncia, impondo-se a sua

anulação por excesso de linguagem. Rejeitou-se, em seguida, a segunda assertiva da defesa. Asseverou-se

que o prosseguimento do feito ocorrera antes da devolução das cartas precatórias, mas depois de escoado

o prazo fixado para o seu cumprimento, o que estaria de acordo com o disposto no art. 222, §§ 1º e 2º, do

CPP (“Art. 222. A testemunha que morar fora da jurisdição do juiz será inquirida pelo juiz do lugar de

sua residência, expedindo-se, para esse fim, carta precatória, com prazo razoável, intimadas as partes. §

1º A expedição da precatória não suspenderá a instrução criminal. § 2º Findo o prazo marcado, poderá

realizar-se o julgamento, mas, a todo tempo, a precatória, uma vez devolvida, será junta aos autos”).

HC 99834/SC, rel. Min. Joaquim Barbosa, 15.2.2011. (HC-99834)

(Informativo 616, 2ª Turma)

Prisão

Recolhimento compulsório e direito de apelar em liberdade - 1

A exigência de recolhimento compulsório do condenado para apelar viola os princípios

constitucionais da ampla defesa, do contraditório e do duplo grau de jurisdição. Com base nesse

entendimento, a 2ª Turma deferiu habeas corpus para que seja devolvido o prazo recursal e expedido

contramandado de prisão em favor do paciente. No caso, o juiz decretara a prisão preventiva do réu para

assegurar a aplicação da lei penal, uma vez que ele não fora localizado e, também, em decorrência da

magnitude da lesão causada, consistente em gestão fraudulenta de dois consórcios (Lei 7.492/86: “Art. 30.

Sem prejuízo do disposto no art. 312 do Código de Processo Penal, aprovado pelo Decreto-lei nº 3.689,

de 3 de outubro de 1941, a prisão preventiva do acusado da prática de crime previsto nesta lei poderá

ser decretada em razão da magnitude da lesão causada. Art. 31. Nos crimes previstos nesta lei e punidos

com pena de reclusão, o réu não poderá prestar fiança, nem apelar antes de ser recolhido à prisão, ainda

que primário e de bons antecedentes, se estiver configurada situação que autoriza a prisão preventiva.”).

HC 103986/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 8.2.2011. (HC-103986)

(Informativo 615, 2ª Turma)

Recolhimento compulsório e direito de apelar em liberdade - 2

Ressaltou-se que o fato de o paciente não ter sido encontrado não seria motivo idôneo para manter a

prisão cautelar. Além disso, consignou-se que o réu não estaria obrigado a colaborar com a instrução

criminal e que a fuga do distrito da culpa, por si só, não autorizaria o decreto constritivo. Assentou-se,

ainda, que exigência de recolhimento compulsório do condenado para recorrer, nos termos do que

disposto no art. 594 do CPP, sem que presentes quaisquer dos pressupostos do art. 312 do CPP, não seria

compatível com a CF/88. Reputou-se que essa mesma conclusão se aplicaria ao disposto no art. 31 da Lei

7.492/86 (Lei do Colarinho Branco), que possui redação análoga à do art. 594 do CPP. Precedente citado:

RHC 83810/RJ (DJe de 23.10.2009).

HC 103986/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 8.2.2011. (HC-103986)

(Informativo 615, 2ª Turma)

Prisão cautelar e ausência de apreciação de HC no STJ

A 1ª Turma deferiu habeas corpus para determinar o julgamento imediato do mérito da impetração

pelo STJ. No caso, pleiteava-se a revogação da prisão cautelar por suposto constrangimento ilegal

infligido ao paciente, tendo em vista a omissão do STJ em apreciar o writ lá impetrado. O feito fora

distribuído em 11.5.2009 e, há mais de 21 meses, sequer fora apreciada a liminar requerida. Não se

conheceu da impetração na parte em que se alegava falta dos pressupostos autorizadores da segregação

cautelar, justamente pelo fato de o STJ não ter analisado a questão. Vencido o Min. Marco Aurélio que

concedia a ordem, ante a ausência de sentença transitada em julgado. Reputava, ademais, que a gravidade

do crime não levaria à prisão e assentava a prejudicialidade do habeas corpus que tramitaria no

mencionado Tribunal Superior.

HC 101970/PA, rel. Min. Dias Toffoli, 15.2.2011. (HC-101970)

(Informativo 616, 1ª Turma)

Prisão cautelar e fundamentos - 1

Em conclusão de julgamento, a 2ª Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus para restabelecer

ordem de prisão preventiva decretada pelo juízo de 1º grau em desfavor do paciente, à época denunciado

pela suposta prática reiterada do crime descrito no art. 213 do CP. Na sessão de 30.11.2010, a Min. Ellen

Gracie, relatora, preliminarmente apontou que a questão já teria sido apreciada nos autos do HC

100429/SP, o que obstaria o conhecimento do writ. No mérito, indeferiu a ordem e revogou a liminar

anteriormente concedida. Aduziu que o decreto prisional, renovado na sentença condenatória

superveniente, teria fundamentação idônea, considerada a necessidade de garantia da ordem pública.

Afirmou que o agente, na condição de médico, teria praticado uma série de crimes contra diversas

pacientes e uma funcionária, durante vários anos, nas dependências de sua clínica, aproveitando-se da

debilidade momentânea das vítimas, algumas sob efeito de sedativos. Nesse sentido, considerada a

gravidade concreta dos crimes perpetrados, bem como seu modus operandi, reputou ser o paciente

perigoso, de modo que existiria o risco de reiteração criminosa, se solto. Ressaltou que o fato de ele estar

impossibilitado de exercer sua profissão, visto que seu registro profissional estaria suspenso pelo

Conselho Regional de Medicina, não impediria eventual prática de novos delitos. Naquela sessão, o

julgamento fora suspenso com o pedido de vista do Min. Joaquim Barbosa.

HC 102098/SP, rel. Min. Ellen Gracie, 15.2.2011. (HC-102098)

(Informativo 616, 2ª Turma)

Prisão cautelar e fundamentos - 2

Na presente assentada, destacou-se, de início, que muito embora houvesse sido expedido novo

decreto prisional contra o paciente, com base na garantia de aplicação da lei penal, após ele haver tentado,

em 27.12.2010, renovar seu passaporte, o suposto constrangimento ilegal, objeto deste writ, estaria

mantido, pois apenas liminarmente suspenso. Salientou-se, também, que, na hipótese de se considerar

inválido o novo título prisional, remanesceria o anteriormente exarado. Preliminarmente, ainda, superouse

o óbice ao conhecimento da impetração apontado pela relatora. Reputou-se que a decisão proferida

naqueles autos de habeas corpus teria se cingido ao não conhecimento da ação com base no Enunciado

691 da Súmula do STF. Nesse sentido, a análise do decreto prisional lá realizada teria sido sumária e

superficial, não fazendo coisa julgada material. No mérito, acompanhou-se o entendimento da relatora

para denegar a ordem.

HC 102098/SP, rel. Min. Ellen Gracie, 15.2.2011. (HC-102098)

(Informativo 616, 2ª Turma)

Prisão cautelar e fundamentos - 3

Vencidos os Ministros Celso de Mello e Gilmar Mendes, que deferiam a ordem. Aduziam não haver

elementos concretos a autorizar a mantença da medida cautelar para a garantia da ordem pública, haja

vista não existir prova cabal de que, uma vez impedido de exercer a medicina, o condenado voltaria a

delinqüir, consideradas as circunstâncias dos crimes e seu modus operandi. Dessa forma, a prisão cautelar

expedida seria mera antecipação de pena. Destacavam que o paciente, durante as investigações criminais,

solto, não teria se comportado de modo a justificar as suposições contidas no decreto prisional e que, dada

a notoriedade dos fatos na mídia, seria pouco provável que outras vítimas em potencial a ele se

submetessem ou que silenciassem diante de novas condutas delitivas.

HC 102098/SP, rel. Min. Ellen Gracie, 15.2.2011. (HC-102098)

(Informativo 616, 2ª Turma)

Progressão de Regime

Exame criminológico e tratamento de usuário de drogas

A 1ª Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus em que se alegava a possibilidade da progressão

de regime prisional a despeito de o tribunal de origem ter negado a referida benesse com base em exame

criminológico. O laudo psicológico atestava a necessidade de tratamento do paciente — condenado por

tráfico de drogas — que ainda se comportava como usuário. Entendeu-se plenamente justificada a

realização do exame criminológico. Contudo, concedeu-se a ordem de ofício para assegurar ao paciente,

usuário de droga, que o Estado lhe ofereça tratamento psicológico por profissional habilitado. Vencido,

em parte, o Min. Marco Aurélio, que deferia o writ por reputar não ser exigível tal exame em face da

supressão do dispositivo que o condicionava para progressão de regime prisional pela norma que alterou a

Lei de Execução Penal.

HC 106477/RS, rel. Min. Dias Toffoli, 1º.2.2011. (HC-106477)

(Informativo 614, 1ª Turma)

Recursos

Agravo em matéria penal e deficiência do traslado - 2

Em conclusão, a 1ª Turma, por maioria, indeferiu habeas corpus em que se pretendia fosse

conhecido agravo de instrumento que visava à subida de recurso especial em matéria penal não admitido

por deficiência do traslado. Na espécie, a decisão impugnada considerara não legível carimbo do

protocolo do recurso especial, na Secretaria do Tribunal de Justiça, determinante para a verificação de sua

tempestividade — v. Informativo 614. Aduziu-se que, conforme precedentes da Corte, seria dever do

recorrente zelar pela correta formação do agravo de instrumento, inclusive em sede criminal, de modo que

a deficiência contida na referida peça processual não poderia ser atribuída ao cartório. Vencido o Min.

Marco Aurélio, que concedia o writ por entender que, em processo criminal, caberia à parte somente

indicar as peças, ao passo que, à Secretaria, providenciar o instrumento.

HC 96647/SP, rel. orig. Min. Marco Aurélio, red. p/ o acórdão Min. Dias Toffoli, 22.2.2011.

(HC-96647)

(Informativo 617, 1ª Turma)

DIREITO TRIBUTÁRIO

Contribuições Sociais

CSLL: EC 10/96 e anterioridade nonagesimal - 1

É indevida a cobrança da contribuição social sobre lucro líquido – CSLL, tal como exigida pela EC

10/96, relativamente ao período de 1º.1.96 a 6.6.96, em observância ao princípio da anterioridade

nonagesimal. Essa a conclusão do Plenário ao desprover recurso extraordinário no qual a União

sustentava a possibilidade dessa exação já a partir de janeiro de 1996. Rejeitou-se, de início, a tese da

recorrente no sentido de que o princípio da anterioridade nonagesimal, previsto no § 6º do art. 195 da CF

(“As contribuições sociais de que trata este artigo só poderão ser exigidas após decorridos noventa dias

da data da publicação da lei que as houver instituído ou modificado, não se lhes aplicando o disposto no

art. 150, III, ‘b’.”), não se aplicaria ao poder constituinte derivado. Enfatizou-se que esse poder não seria

ilimitado, submetendo-se ao que fixado no art. 60 da CF. Registrou-se, ademais, que o princípio da

anterioridade nonagesimal configuraria uma garantia individual e, como conseqüência, cláusula pétrea,

não passível de supressão por emenda constitucional.

RE 587008/SP, rel. Min. Dias Toffoli, 2.2.2011. (RE-587008)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 614, Plenário, Repercussão Geral)

CSLL: EC 10/96 e anterioridade nonagesimal - 2

Em seguida, assinalou-se que a controvérsia teria origem na Emenda Constitucional de Revisão –

ECR 1/94 que, ao instituir o Fundo Social de Emergência para os exercícios de 1994 e 1995, estabelecera

como parcela integrante desse fundo o produto da arrecadação que resultara da elevação da alíquota da

CSLL para 30% exclusivamente para os contribuintes por ela mencionados (ADCT, art. 72, III), dentre os

quais a recorrida, empresa de arrendamento mercantil. Ocorre que, depois de expirado o prazo de

vigência da aludida ECR, sobreviera, em 4.3.96, a EC 10/96, a qual, em seu art. 2º, alterara a redação do

art. 72, III, do ADCT para estender a cobrança da CSLL “bem assim no período de 1º de janeiro de 1996

a 30 de junho de 1997”. Reputou-se que, embora o objetivo da emenda questionada tivesse sido a não

interrupção de vigência do referido inciso III, no caso, não houvera mera prorrogação, pois ocorrera

solução de continuidade entre o término do prazo de vigência da ECR 1/94 e a promulgação da EC 10/96.

Enfatizou-se que a expressão em apreço procedera da demora na tramitação da emenda. Assim, destacouse

que, vencido o prazo de vigência daquela, a contribuinte passara a recolher o tributo à alíquota de 18%

(Lei 9.249/95, art. 19). Entendeu-se que a EC 10/96 seria um novo texto, veiculador de norma nova e

retroativa a janeiro de 1996, devendo, pois, respeitar o princípio da anterioridade nonagesimal, haja vista

que teria havido majoração da alíquota da CSLL.

RE 587008/SP, rel. Min. Dias Toffoli, 2.2.2011. (RE-587008)

(Informativo 614, Plenário, Repercussão Geral)

Decreto-lei 2.052/83 e contribuintes do PASEP - 2

Em conclusão de julgamento, o Plenário, ao prover recurso extraordinário, declarou a

inconstitucionalidade do art. 14, VI, do Decreto-lei 2.052/83, que inclui, como contribuintes do PASEP,

“quaisquer outras entidades controladas, direta ou indiretamente, pelo Poder Público”. Na espécie,

companhia de seguros questionava acórdão que decidira pelo seu enquadramento como contribuinte do

PASEP, por ser ela controlada pelo Poder Público — v. Informativo 402. Preliminarmente, por maioria,

conheceu-se do recurso, vencido, no ponto, o Min. Marco Aurélio, que entendia haver questão relativa ao

próprio sistema, a exigir, em primeiro lugar, o pronunciamento do STJ para, após, ser julgado, se não

prejudicado pela decisão daquele tribunal, o extraordinário simultaneamente interposto. No mérito,

reputou-se que o PIS e, da mesma forma, o PASEP — por ter perdido a natureza tributária a partir da EC

8/77 e não se inserir no âmbito das finanças públicas — não poderia ser alterado por decreto-lei.

RE 379154/RS, rel. orig. Min. Carlos Velloso, red. p/ o acórdão Min. Joaquim Barbosa,

23.2.2011. (RE-379154)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 617, Plenário)

Impostos

IPI e “leasing” internacional - 1

A 2ª Turma desproveu recurso extraordinário em que discutida a incidência do Imposto de

Importação – II e do Imposto sobre Produtos Industrializados – IPI sobre operação de importação

amparada por arrendamento mercantil financeiro (leasing). A recorrente sustentava: a) insubmissão do

arrendamento mercantil, que seria um serviço, ao fato gerador do imposto de importação; b) violação do

princípio da isonomia, na medida em que seria proibida a adoção do regime de admissão temporária para

as operações amparadas por arrendamento mercantil; c) contrariedade à regra da legalidade, uma vez que

a alíquota do imposto de importação teria sido definida por decreto e não por lei em sentido estrito; e d)

vilipêndio ao dever fundamental de prestação de serviços de saúde, pois o bem tributado seria

equipamento médico.

RE 429306/PR, rel. Min. Joaquim Barbosa, 1º.2.2011. (RE-429306)

(Informativo 614, 2ª Turma)

IPI e “leasing” internacional - 2

Aduziu-se, inicialmente, que a importação de produto mediante contrato de arrendamento mercantil

implicaria tanto prestação de serviço (leasing) quanto a própria importação, de maneira que a incidência

de tributos diferentes não significaria bitributação. Ademais, entendeu-se não ter sido violado o princípio

da isonomia, uma vez que o objetivo da tributação do arrendamento mercantil seria não torná-lo mais

atrativo que as operações de compra e venda financiada apenas por vantagens fiscais. Nesse sentido,

operações idênticas ou bastante semelhantes deveriam gerar cargas tributárias muito próximas,

independentemente da formatação do negócio jurídico. Além disso, reputou-se ausente ofensa à regra da

legalidade, pois a Constituição, no § 1º do seu art. 153, permitiria expressamente que as alíquotas do

imposto de importação fossem definidas pelo Poder Executivo, observados os limites estabelecidos em

lei. Por fim, reconheceu-se não haver transgressão ao dever fundamental de prestação de serviços de

saúde, pois, embora o princípio da seletividade impusesse que a carga tributária fosse graduada conforme

a essencialidade da operação ou do produto, não haveria imunidade, considerados os princípios da

capacidade contributiva, da concorrência, da livre iniciativa e da solidariedade no custeio das atividades

estatais.

RE 429306/PR, rel. Min. Joaquim Barbosa, 1º.2.2011. (RE-429306)

(Informativo 614, 2ª Turma)

ICMS e alienação de salvados de sinistros - 1

O ICMS não incide sobre a alienação de salvados de sinistros pelas seguradoras. Esse o teor da

Súmula Vinculante 32 cuja edição foi aprovada pelo Plenário após dar provimento, por maioria, a recurso

extraordinário interposto contra acórdão que, com base na Súmula 152 do Superior Tribunal de Justiça -

STJ, reputara cabível essa incidência. Deliberou-se, ainda, que os Ministros decidam monocraticamente

os casos idênticos. Na mesma linha do que firmado no julgamento da ADI 1648/MG, anteriormente

relatada, reconheceu-se a inconstitucionalidade da expressão “e a seguradora”, constante do antigo item 4

do § 1º do art. 7º da Lei 6.374/89, do Estado de São Paulo. Prevaleceu o voto do relator, Min. Gilmar

Mendes, que salientou, de início, que o STF há muito possuiria jurisprudência contrária ao acórdão

recorrido (ADI 1332 MC/RJ, DJU de 11.4.97), segundo a qual não competiria aos Estados, mas à União,

tributar a alienação de salvados, que se integraria à operação de seguros (CF, art. 153, V).

RE 588149/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 16.2.2011. (RE-588149)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 616, Plenário, Repercussão Geral)

ICMS e alienação de salvados de sinistros - 2

Observou que, em razão de ser vedada às sociedades seguradoras, nos termos do art. 73 do Decretolei

73/66, a exploração de qualquer outro ramo de comércio ou indústria, elas não seriam e nem poderiam

ser comerciantes de sucata. Acrescentou que, por disposição contratual, as seguradoras receberiam por ato

unilateral a propriedade do bem nas hipóteses em que, em decorrência de sinistro, tivesse este perdido

mais de 75% do valor do segurado. Asseverou que as companhias de seguro seriam obrigadas a pagar ao

segurado 100% do valor do bem e que a posterior venda, por elas, dos salvados teria, no máximo, o

condão de recuperar parte da indenização que houvesse superado o dano ocorrido. Enfatizou que, por

isso, não haveria finalidade de obter lucro, nem, portanto, intenção comercial. Registrou ser esse o sentido

da jurisprudência da Corte, conforme depreendido do Enunciado 541 da sua Súmula (“O imposto sobre

vendas e consignações não incide sobre a venda ocasional de veículos e equipamentos usados, que não

se insere na atividade profissional do vendedor, e não é realizada com o fim de lucro, sem caráter, pois,

de comercialidade”).

RE 588149/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 16.2.2011. (RE-588149)

(Informativo 616, Plenário, Repercussão Geral)

ICMS e alienação de salvados de sinistros - 3

Concluiu que o objeto das operações das seguradoras seria o seguro e que a eventual venda dos

salvados não os tornaria mercadorias, porquanto as companhias seguradoras não possuiriam por objeto

social a circulação de mercadorias, constituindo a referida alienação um elemento da própria operação de

seguro. Mencionou, também, que o STJ teria cancelado o Enunciado 152 de sua Súmula, o que

demonstraria adesão ao entendimento do STF. Além disso, afirmou que a Lei paulista 9.399/96 teria dado

nova redação à Lei estadual 6.374/89, para excluir a expressão “e a seguradora” de seu item 4 do § 1º do

art. 7º, razão pela qual teria havido perda de objeto da ADI 1390/SP (DJU de 6.2.2002). Tal fato

permitiria, ainda, deduzir que o Estado de São Paulo de igual modo aderira às razões expendidas pela

jurisprudência do STF. Vencidos os Ministros Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa e Ayres Britto

que negavam provimento ao recurso.

RE 588149/SP, rel. Min. Gilmar Mendes, 16.2.2011. (RE-588149)

(Informativo 616, Plenário, Repercussão Geral)

ISS e cessão de direito sobre uso de marca

A 2ª Turma negou provimento a agravo regimental em reclamação na qual se alegava não ser

devido o Imposto sobre Prestação de Serviço – ISS sobre contratos de locação de bens móveis. Reputouse

que a decisão paradigma invocada na reclamação não abrangeria o auto de infração cuja manutenção e

inscrição na dívida ativa seria o ato reclamado. Ademais, concluiu-se que se trataria de cessão de direito

sobre uso de marca, que não poderia ser considerada locação de bens móveis, mas serviço autônomo,

como previsto na Lei Complementar 116/2003. Assim, não haveria a incidência da Súmula Vinculante 31

(“É inconstitucional a incidência do imposto sobre serviços de qualquer natureza – ISS sobre operações

de locação de bens móveis.”)

Rcl 8623 AgR/RJ, rel. Min. Gilmar Mendes, 22.2.2011. (RCL-8623)

(Informativo 617, 2ªTurma)

Taxas

Decisão do CNJ e destinação de taxa judiciária a entidades de classe

O Plenário indeferiu mandado de segurança impetrado pela Associação Matogrossense dos

Defensores Públicos – AMDEP contra decisão do Conselho Nacional de Justiça – CNJ e declarou,

incidentalmente, a inconstitucionalidade da Lei matogrossense 8.943/2003 que — ao alterar a Lei

7.603/2001, que fixou o valor das custas, despesas e emolumentos relativos aos atos praticados no Foro

Judicial — instituiu contribuição para a associação impetrante. Na espécie, o CNJ julgara procedente

pedido de providências para determinar ao Tribunal de Justiça do Estado de Mato Grosso a revisão de

seus atos normativos sobre regime de custas, no sentido de expurgar qualquer cobrança de emolumento

judicial com destinação a qualquer entidade de classe e/ou com finalidade privada. Alegava a impetrante

que a cobrança de custas e emolumentos e o direito à participação da impetrante em parte delas

encontraria previsão legal e que o CNJ teria usurpado competência jurisdicional do STF ao retirar a

eficácia do art. 1º da Lei 8.943/2008. Entendeu-se que o CNJ, sem declarar a inconstitucionalidade dos

diplomas legislativos locais, zelara pela supremacia da Constituição Federal, tendo citado vasta

jurisprudência do STF no sentido da inconstitucionalidade da destinação da arrecadação de custas, taxas

judiciárias e emolumentos a instituições privadas ou entidades de classe. Ressaltou-se, ainda, que o CNJ

determinara o encaminhamento da sua decisão à Procuradoria Geral da República para análise das leis

matogrossenses, a fim de que esta adotasse as medidas que reputasse cabíveis para sanar eventual

frustração dos comandos constitucionais relativos à isonomia tributária.

MS 28141/MT, rel. Min. Ricardo Lewandowski, 10.2.2011. (MS-28141)

1ª parte

2ª parte

3ª parte

(Informativo 615, Plenário)

Supremo Tribunal Federal

Secretaria de Documentação - SDO

Coordenadoria de Jurisprudência Comparada e Divulgação de Julgados - CJCD

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sábado, 26 de março de 2011

A Revolução na China e na Europa

Karl Marx

Julho 1853

Primeira Edição: Artigo publicado no New York Daily Tribune de 14 de Julho de 1853.

Fonte: The Marxists Internet Archive

Tradução: Jason Borba

Um dos mais profundos, ainda que fantástico, especulador depois de ter consagrado toda a sua existência

à descoberta das leis que regem a evolução da humanidade, tinha a lei da unidade dos contrários por um

dos mistérios dominantes da natureza. Aos seus olhos o bom e velho provérbio segundo o qual "os

extremos se tocam" representava a verdade suprema, eficaz em todos os domínios da vida, um axioma ao

qual o filósofo não podia renunciar, assim como o astrônomo às leis de Kepler ou à grande descoberta de

Newton.

Podemos encontrar uma ilustração clara da universalidade, ou não, deste famoso princípio no efeito que a

revolução chinesa parece estar sendo conclamada a provocar no mundo civilizado. Pode parecer muito

estranho e paradoxal afirmar que o próximo levantamento dos povos europeus em favor da liberdade

republicana dependerá provavelmente mais do que se passa no Celeste Império - no pólo oposto da

Europa - do que de qualquer outra causa política atual. Em qualquer dos casos, dependerá mais disso que

das ameaças da Rússia e da perspectiva que abrem a um conflito europeu generalizado. De fato, não há

nada de paradoxal naquela afirmação, sendo o que não pode deixar de reconhecer quem considere mais de

perto as circunstâncias presentes.

Quaisquer que sejam as causas que têm determinado as revoltas crônicas destes últimos dez anos na

China, revoltas que hoje estão confluindo para uma gigantesca convulsão, qualquer que seja a forma que

esta venha a revestir - religiosa, dinástica ou nacional - ninguém duvida que o seu motor são os canhões

ingleses, que impõem à China a droga suporífera chamada ópio.

Perante as armas britânicas, a autoridade da dinastia mandchou caiu em pedaços; a fé supersticiosa na

eternidade do Celeste Império desapareceu; o bárbaro isolamento hermético do mundo civilizado

quebrou-se; uma brecha se abriu para as relações de troca que rapidamente se desenvolveram, graças às

seduções do ouro da Califórnia e da Austrália. Ao mesmo tempo, a moeda de prata, sangue vital do

Império, vai escorrendo para as Índias orientais britânicas.

Até 1830, a balança comercial foi continuamente favorável aos chineses, e um fluxo ininterrupto de

dinheiro provinha das Índias, da Inglaterra e dos Estados Unidos. Mas, desde 1833, e mais ainda desde

1840, a exportação de dinheiro para as Índias tomou tais proporções que o Celeste Império se encontra

hoje exaurido. Donde os decretos rigorosos do Imperador contra o comércio do ópio, contra os quais se

volta uma resistência mais firme ainda. Além desta consequência econômica direta, a corrupção, surgida

em torno do contrabando de ópio, arruinou completamente o prestígio tradicional dos funcionários do

Império nas províncias meridionais. Do mesmo modo como tradicionalmente se gostava de considerar o

Imperador como o pai de toda a China, via-se nos seus funcionários os guardiões dos laços que uniam o

pai às suas províncias respectivas. Ora esta autoridade patriarcal - o único vínculo moral abrangendo a

gigantesca máquina de Estado - foi progressivamente minada pela corrupção dos funcionários que

arrecadaram fortunas consideráveis em conivência com os traficantes de ópio.

Precisamente as províncias meridionais onde irrompeu a revolta foram as mais afetadas. Necessário seria

acrescentar que, à medida que o ópio estende o seu poder sobre os chineses, o Imperador e seu séquito de

mandarins pedantes são, por seu lado, privados do poder? É como se a história devesse primeiro

embriagar todo um povo, antes de poder arrancá-lo do seu torpor milenar.

No passado, depois de ter sido praticamente nula, a importação de algodões ingleses e, em menor grau, de

lãs inglesas, aumentou rapidamente depois de 1833 - ano em que o monopólio do comércio com a China

passou da Companhia das Índias Orientais para o comércio privado - e mais rapidamente ainda depois de

1840, ano em que outras nações, nomeadamente a nossa (americana - R.D.), conseguiram por sua vez

participar no comércio com a China. Esta penetração da mercadoria estrangeira provocou no artesanato

local os mesmos efeitos que antes tinha provocado na Ásia Menor, na Pérsia e nas Índias. Na China,

foram os fiadores e os tecelões quem mais sofreu com a concorrência estrangeira, e, como decorrência,

toda a comunidade foi abalada.

O tributo a pagar à Inglaterra na sequência da guerra desastrosa de 1840, o enorme consumo improdutivo

de ópio, a hemorragia de metais preciosos como consequência do comércio de ópio, a ação devastadora da

concorrência estrangeira sobre a produção local e o estado de desmoralização da administração pública

tiveram um duplo efeito: os impostos tradicionais tornaram-se mais pesados e mais opressivos, e vieram

impostos novos juntar-se aos antigos. Num decreto datado de Pequim, 5 de janeiro de 1853, o Imperador

deu ordem aos vice-reis e governadores das províncias meridionais de Wouchang e Hanyang de diferir e

enviar os impostos e, sobretudo, de não guardarem para sí mais que o montante prescrito, porque, segundo

o decreto, "como poderia a população pobre suportá-lo?". E prosseguia o Imperador: "E, deste modo, em

período de miséria e penúria gerais, talvez o meu povo seja poupado às perseguições e torturas dos

coletores de impostos." Lembramos de ter ouvido esta mesma linguagem e visto aplicar medidas

semelhantes na Áustria, a China da Alemanha, em 1848.

Todos estes fatores de dissolução influíram simultaneamente nas finanças, nos costumes tradicionais, na

indústria e na estrutura política da China, e atingiram o paroxismo sob o fogo dos canhões ingleses, que

arruinaram a autoridade do Imperador e, pela violência, estabeleceram o contato entre o Celeste Império e

o mundo terrestre. O isolamento total era condição necessária para a preservação da velha China. Agora

que este isolamento cessou brutalmente, graças à Inglaterra, a dissolução da velha China é tão certa como

a de uma múmia cuidadosamente conservada num sarcófago hermeticamente fechado e que se expõe ao

ar. Agora que a Inglaterra desencadeou a revolução na China, temos de perguntar-nos qual a reação que a

revolução vai provocar nesse país, e, daqui a algum tempo, na Inglaterra, e, daí, na Europa. A resposta não

é difícil.

Com certeza o crescimento sem precedentes da indústria manufatureira britânica depois de 1850

despertou a atenção dos leitores muitas vezes. Contudo, e no meio dessa espantosa prosperidade, não é

difícil discernir desde já os sintomas bem nítidos da aproximação de uma crise industrial. Apesar da

Califórnia e da Austrália, apesar de uma emigração massiva sem precedentes, é inevitável que, num certo

ponto, e postos de lado incidentes particulares, chegue o momento em que a extensão dos mercados já não

poderá acompanhar o ritmo do desenvolvimento das manufaturas inglesas, sendo que tal desequilíbrio

produzirá uma nova crise, tão necessariamente como o passado já se produziu. Se, ainda por cima, uma

das mais vastas vias de escoamento se fechar subitamente, isso acelerará inevitavelmente a crise. Ora, no

ponto em que as coisas estão, o levantamento chinês irá produzir precisamente este efeito na Inglaterra.

A necessidade de abrir novos mercados ou de alargar os antigos foi uma das causas principais da redução

das tarifas do chá, porque se esperava que uma maior importação deste artigo fosse acompanhada de uma

maior exportação de produtos industriais para a China.

O valor das exportações anuais do Reino Unido para a China alcançava apenas 600 000 £ em 1834, antes

da abolição do monopólio comercial da Companhia das Índias Orientais. Ora, em 1836, já atingia 1 336

388 £, e chegava a 3 000 000 £ em 1852. A quantidade de chá importado da China era de apenas 16 167

331 libras em 1793, mas em 1845 chegava a 50 714 657 libras, e em 1846 a 57 684 561 libras, hoje ronda

as 60 000 000 libras.

A última colheita de chá na China ultrapassará em pelo menos 2 000 000 libras a do ano anterior, como as

listas de exportação de Xangai mostram desde já. Este excedente explica-se por duas razões. Por um lado,

o mercado encontrava-se muito deprimido em fins de 1851, e um excedente considerável não vendido foi

oferecido à exportação do ano de 1852. Por outro lado, as notícias chegadas à China a respeito das

modificações nas tarifas aduaneiras britânicas do chá fizeram afluir todo o chá disponível, com preços

consideravelmente mais caros, a um mercado ansioso por absorvê-lo. Mas, no que diz respeito à próxima

colheita, a perspectiva é muito diferente. É o que ressalta dos extratos seguintes da correspondência de

uma grande firma de chá londrina:

"Reina a maior consternação em Xangai. O valor do ouro aumentou 25% devido ao fato de ser procurado

avidamente para entesourar; o dinheiro desapareceu, ao ponto de já não ser possível encontrá-lo para

pagar os direitos chineses sobre os navios britânicos que entram nos portos; é por isso que o senhor cônsul

Alcock teve que declarar-se fiador junto às autoridades chinesas dos pagamentos dessas somas, contra

letras de câmbio da Companhia das Índias Orientais ou outras cauções e valores reconhecidos. A penúria

de metais preciosos é um dos fatores mais negativos no concernente às perspectivas imediatas de futuro

do comércio, tanto mais que a sua rarefação sobrevêm precisamente num momento em que o seu uso se

torna necessário para permitir aos compradores de chá e de seda proceder, no país de origem, às suas

compras, nas quais uma parte considerável tem que ser paga adiantada em ouro e prata de modo que os

produtores possam continuar o seu trabalho...

Neste período do ano é usual começar as negociações sobre o novo chá. Ora, como atualmente cuida-se

apenas de proteger pessoas e bens, todos os negócios ficam em suspenso... Se não se tomarem medidas

para assegurar as folhas de chá em Abril e Maio, a primeira colheita, que é a que produz as espécies mais

finas de chá preto e verde, perder-se-á tão seguramente como trigo que no Natal ainda esteja no solo."

Nestas condições, os meios para assegurar a colheita do chá não serão certamente fornecidos pelas

esquadras inglesas, americanas ou francesas fundeadas nos mares da China. Pelo contrário, a intervenção

destas últimas poderá facilmente criar complicações que só acabarão por levar à ruptura de todas as

relações comerciais entre as regiões do interior, produtoras de chá, e os portos marítimos de exportação.

Na próxima colheita irá verificar-se importante déficit. Mas há mais, pois, estando dispostos - como todos

os povos em período de convulsões revolucionárias - a vender precipitadamente aos estrangeiros todos os

produtos que os estorvam, os chineses vão começar a entesourar - como é costume dos orientais - na

ansiosa expectativa de desordens graves, não aceitando senão dinheiro sonante e de bom peso em troca do

seu chá e seda.

A Inglaterra deve portanto contar com uma alta dos preços de um dos seus artigos de consumo básico,

com uma fuga de metais preciosos e com forte redução do seu importante mercado de algodões e de lãs.

O próprio Economist, apesar de normalmente otimista e de exorcizar imediatamente tudo o que ameace a

paz das almas da comunidade comercial, é obrigado a confessar:

"Temos que deixar de congratular-nos por encontrar hoje na China um mercado tão vasto como o foi no

passado... É mais que provável que o nosso comércio de exportação para a China deva enfraquecer, e que

os artigos produzidos em Manchester e em Glasgow padeçam de uma menor procura."

Não esqueçamos que a subida do preço de um artigo tão indispensável como o chá e a contração de um

mercado tão importante como a China irão coincidir com colheitas deficitárias na Europa Ocidental, logo,

com um aumento dos preços da carne, do trigo e de outros produtos agrícolas. Logo, o mercado dos

artigos manufaturados contrair-se-á, dado que cada subida dos preços dos produtos de primeira

necessidade implica, no exterior como no interior, uma correspondente diminuição da procura de artigos

manufaturados. Em todas as regiões da Grã-Bretanha se lamenta este déficit nas diversas colheitas. O

Economist escreve a este respeito:

No sul da Inglaterra, "não só numerosas terras ficarão por cultivar até ser demasiado tarde para qualquer

semeadura, como também, num grande número de casos, a colheita apodrece na terra, ou o seu mau trato

não permite sequer a cultura de cereais". Nas terras pobres ou úmidas, destinadas ao trigo, todo indica que

a colheita será má: "Já é demasiado tarde para plantar a beterraba forrageira. Ora, plantou-se muito pouca,

enquanto o tempo de preparar a terra para couves passa rapidamente, sem que nenhum preparativo

adequado para um produto de tanta importância tenha sido tentado... A semeadura da aveia serôdia só

raramente dá uma colheita abundante. Em numerosos distritos a criação de gado registrou perdas

sensíveis. Sem falar dos cereais, o preço dos outros produtos agrícolas é superior em 20, 30 e mesmo 50%

ao do ano anterior. No continente o preço dos cereais subiu em proporções ainda maiores que na

Inglaterra. Na Bélgica e na Holanda o centeio aumentou 100%. O trigo e outros cereais seguem-no de

perto"

Nestas condições, e dado que a indústria britânica já percorreu a maior parte do seu ciclo econômico

normal, pode prever-se com segurança que a revolução chinesa vai provocar uma faísca no paiol repleto

de pólvora que é o atual sistema industrial, provocando a eclosão da crise geral que de há muito vem

amadurecendo. E que, depois de se manifestar na Inglaterra, será seguida prontamente por revoluções

políticas no continente.

E será, na verdade, espetáculo curioso vermos a China exportar a desordem para o mundo ocidental, no

preciso momento em que as potências ocidentais, as frotas de guerra britânica, francesa e americana

rivalizam no zelo pela instauração da ordem em Xangai, Nanquim, e no acesso ao Grande Canal. Estas

potências, mercadores da Ordem e prontas a apoiar a periclitante dinastia mandchou, terão esquecido que

a xenofobia e a exclusão dos estrangeiros do Império - outrora simples efeito da situação geográfica e

etnográfica da China - tornaram-se princípios políticos precisamente desde a conquista do país pelos

tártaros mandchou?

Não resta dúvidas de que as violentas dissensões entre as nações européias concorrentes deram forte

impulso à política isolacionista adotada nos últimos anos do século XVII pelos mandchou. Mas o que

contribuiu, pelo menos na mesma medida, para essa política foi o fato da nova dinastia recear que os

estrangeiros estimulassem o descontentamento de largas camadas da população chinesa durante o

primeiro meio século de domínio tártaro. Por todas estas razões, os estrangeiros viram ser-lhes interditada

toda a comunicação com os chineses, exceto por Cantão, cidade situada a grande distância de Pequim e

dos distritos produtores do chá, e o comércio restringido ao negócio com os comerciantes Hong, aos quais

o governo outorgou expressamente o privilégio de comerciar com o exterior, excluindo desse modo seus

restantes súditos de qualquer contato com os intoleráveis intrusos. Seja como for, a ingerência dos

governos ocidentais neste preciso contexto só terá como consequência acentuar o caráter violento da

revolução, e agravar o estrangulamento do comércio.

Convém observar, ao mesmo tempo, que o governo britânico retira da Índia bem um sétimo dos seus

lucros com a venda de ópio aos chineses, ao passo que uma fração considerável da procura indiana de

produtos manufaturados britânicos depende da produção na Índia desse mesmo ópio. Os chineses

renunciarem ao uso do ópio é tão provável como ver os alemães absterem-se de fumar tabaco. Mas como

o novo Imperador parece favorável à cultura da dormideira e à preparação do ópio na própria China,

parece claro que irá ser dado um golpe mortal na cultura do ópio na Índia, nas receitas do estado indiano e

nos meios comerciais hindustânicos. Mesmo que não fosse imediatamente sentido pelos interesses em

causa, este golpe iria todavia acabar produzindo todos seus efeitos, e contribuiria para agravar e prolongar

a crise financeira geral da qual estamos estabelecendo o esquema previsível.

Desde o começo do século XVIII não houve na Europa uma revolução importante que não fosse precedida

por uma crise comercial e financeira. Isto se aplica tanto à revolução de 1789 como à de 1848. É certo que

se observam sintomas de conflitos cada vez mais graves entre as autoridades e os que lhe estão

submetidos, o Estado e a sociedade, as diferentes classes; e, acima de tudo, os conflitos entre potências

estão prestes a atingir o ponto em que se desembainham as espadas, em que se recorre à última ratio dos

príncipes. Nas capitais européias, cada dia traz consigo despachos, reflexos de um conflito geral, que logo

no dia seguinte novos despachos vêm ultrapassar, trazendo uma garantia de paz, por oito ou dez dias. De

qualquer forma, podemos estar certos que, por muito grave que possa vir a tornar-se o conflito entre as

potências rivais, por carregado que possa parecer o horizonte diplomático, ou qualquer ação que possa vir

a ser tentada por tal ou tal fração dinâmica de uma dada nação, a raiva dos príncipes e a cólera popular

estão igualmente desarmadas pelos ventos da prosperidade. É pouco provável que as guerras e revoluções

assolem a Europa se não forem o resultado de uma crise geral, comercial, e industrial, cujo sinal, como

sempre, deverá ser dado pela Inglaterra, representante da indústria européia no mercado mundial.

Não é preciso sequer insistir nas consequências políticas que uma tal crise poderia produzir nos nossos

dias - com a vertiginosa expansão das fábricas inglesas e a decomposição total dos partidos oficiais, com a

enorme máquina do estado francês transformada numa única e imensa agência de especulação e desvio

dos fundos públicos, com a Áustria à vésperas da bancarrota, com as injustiças que por todo o lado se

acumulam e conclamam a vingança popular, com os interesses em conflito no seio das potências

reacionárias, com os sonhos russos de conquista mais uma vez se declarando.

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