quinta-feira, 18 de março de 2010

STF fecha portas para recursos sobre repercussão geral

Elaborado em 11.2009.

Thomaz Thompson Flores Neto

advogado em Porto Alegre (RS)


Recente decisão do Plenário da Suprema Corte fixou que não cabe recurso ao STF para solucionar equívocos na aplicação da repercussão geral.

O entendimento, que pode representar denegação de justiça, surpreende e intensifica a sensação de insegurança jurídica.

O Supremo, "por unanimidade, resolveu a questão de ordem no sentido de não conhecer do agravo de instrumento [nº 760358] e de devolvê-lo ao tribunal de origem para que o julgue como agravo regimental".

O agravo de instrumento em questão impugnava equivocada decisão Tribunal de Justiça de Sergipe, fato reconhecido pelos próprios ministros do STF.

O equívoco do TJSE consubstanciou-se em negar seguimento ao recurso extraordinário mediante aplicação analógica de uma decisão do Supremo, ou seja, não se tratava de "idêntica controvérsia", conforme dispõe expressamente o artigo 543-B do Código de Processo Civil, e sim hipótese de mera semelhança.

Diante do erro inconteste, assim reconhecido pelo Plenário, por que o STF não deu logo provimento ao agravo de instrumento, como seria de se esperar?

Ocorre que a Suprema Corte tem constatado números crescentes de agravos de instrumento contra decisões que negam seguimento a recursos extraordinários e, também, significativo aumento de reclamações contra decisões que obstam a subida de agravos de instrumento, tomadas com base em precedentes do STF (não-raro equivocadas, como no caso do Tribunal de Sergipe).

Temem, os ministros, que o quadro se agrave comprometendo a eficácia das medidas desafogadoras que vem sendo implementadas. Daí terem decidido que em tais hipóteses "não cabe recurso ao STF".

Segundo assentado pelo Plenário, a parte vítima da decisão errônea deve buscar resolver o problema na origem: se a decisão equivocada for monocrática, deve agravá-la regimentalmente; se for colegiada, impetrar mandado de segurança.

A solução preconizada pode resolver um possível problema operacional do Supremo, contudo, fechar as portas do STF ao recorrente, isso num crucial momento processual, não parece a mais consentânea com a preservação de relevantes princípios da ordem constitucional.

Ademais, os dois caminhos alternativos alvitrados pelos eminentes ministros tratam-se de vias, à evidência, inadequadas.

Basta observar que a jurisprudência pátria é firme no sentido de não caber agravo regimental das decisões de presidentes e vice-presidentes em sede de juízo de prelibação.

Em recente decisão unânime da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça (Ag 1036701-RJ, DJe 08.10.2009), esse posicionamento restou muito claro: "PROCESSO CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL. A decisão que, na forma do artigo 328-A, da Emenda Regimental nº 23, de 2008, do Supremo Tribunal Federal, julga prejudicado o agravo de instrumento interposto contra a decisão que nega seguimento a recurso extraordinário não pode ser contrastada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça; trata-se de decisão proferida no exercício de jurisdição delegada pelo Supremo Tribunal Federal, de modo que só este pode reformá-la. Agravo regimental não conhecido."

No que tange a sugerida impetração de mandado de segurança, a idéia não é mais feliz. Qual a teratologia existente numa decisão judicial que, em decorrência de simples equívoco de interpretação, aplica um precedente similar ao invés de um idêntico à controvérsia examinada? Que direito líquido e certo possui o recorrente de ter o seu recurso extraordinário apreciado pelo STF?

E pior: eventual recurso ordinário de decisão que denegue a segurança terá como destino o Superior Tribunal de Justiça, por força da Constituição da República (art. 105, II, b). Quer dizer, o STJ iria apreciar questão afeta ao mérito da repercussão geral, matéria de competência absoluta do STF?

É compreensível, que em plena fase de implementação de novos mecanismos e institutos criados para viabilizar o Judiciário, dentre estes a repercussão geral, aprimoramentos na regulamentação sejam introduzidos na medida em que se verifiquem problemas.

Como é perfeitamente natural que os ministros estejam preocupados com a preservação da eficácia dos novos mecanismos. Qualquer operador do Direito que se visse na posição de Ministro certamente pensaria assim.

Contudo, não é razoável, simplesmente, fechar as portas.

Se expressivo e crescente número de litigantes mal-intencionados estão a agravar e reclamar sem o menor cabimento (o que é difícil de crer), fazendo-o mesmo diante da manifesta correta aplicação pelos tribunais dos precedentes do STF, a litigância de má-fé deve ser penalizada como prevê a lei. É cediço que sem leniência práticas espúrias tendem a ser inibidas.

Mas, insista-se, não é razoável, simplesmente, fechar as portas, pois o fazendo o STF não apenas deixa os recorrentes entregues à própria sorte, mas, sobretudo, abdica de ponderável parcela de sua autoridade e competência.

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